|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FAZENDEIRO DO AR
Papéis contradizem a versão apresentada pelo ministro
Documentos atestam que Jucá
deu fazendas como garantia
RUBENS VALENTE
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
Documentos que integram processos judiciais contradizem a defesa apresentada pelo ministro da
Previdência, Romero Jucá
(PMDB-RR), desde a revelação de
que deu como garantia fazendas
inexistentes, no interior do Amazonas, em empréstimo contraído
no Basa (Banco da Amazônia).
Segundo o ministro, ele não é o
responsável pela apresentação
das garantias porque, na época do
envio da relação dos bens ao banco, a empresa Frangonorte, de
Boa Vista (RR), pertencia a Luiz
Carlos Fernandes de Oliveira.
"As fazendas, portanto, foram
dadas em garantia por Luiz Carlos, e não pelo ministro. Jucá apenas transferiu suas cotas na empresa ao novo proprietário, há oito anos, por meio de um documento citado pelo jornal [Folha]", diz nota divulgada pela assessoria do ministro na segunda.
Os papéis que integram o empréstimo, contudo, mostram que
Jucá, além de fiador e pagador da
operação, era o dono da Frangonorte na época da apresentação
das fazendas aos representantes
do Basa, em 12 de agosto de 1996.
O quinto instrumento de alteração contratual da empresa demonstra que, em 27 de agosto de
1996, 15 dias depois da assinatura
do ato que tratou das novas garantias, Jucá seguia proprietário
da empresa, ao lado do ex-governador de Roraima Getúlio Cruz.
Nessa data (27 de agosto) eles
aceitam pela primeira vez Oliveira
como sócio, mas permanecem
proprietários da empresa.
O sexto instrumento, portanto
posterior ao quinto e ao dia 27 de
agosto, não é datado. É apenas nele, que por sua vez nada fala sobre
fazendas no Amazonas, que Jucá
e Cruz cedem as cotas a Oliveira.
Quando é feito o registro do sexto instrumento de alteração contratual da Frangonorte, em janeiro de 1997, já havia se passado seis
meses desde a apresentação das
fazendas como garantia.
O fato de serem donos da Frangonorte em 12 de agosto leva Jucá
e Cruz a assinarem o documento
na qualidade de "fiadores e principais pagadores". Cruz também
assina como responsável pela
Frangonorte. Como Oliveira não
era dono da empresa, aparece como "hipotecante interveniente"
(terceiro que indica propriedade
para hipoteca como garantia de
pagamento de dívida de outros).
Essa figura, segundo especialistas ouvidos pela Folha e acórdãos
de diferentes tribunais, não exonera a responsabilidade dos reais
devedores. Jucá e Cruz são réus na
ação de execução de dívida (R$ 18
milhões) movida pelo Basa na 11ª
Vara Cível de Belém (PA).
O segundo ponto da defesa do
ministro é relacionado à natureza
do documento que trata da apresentação das garantias.
Em síntese, Jucá alega que o documento era parte de "consolidação das dívidas" da empresa com
o banco e transferência de cotas
entre sócios (de Jucá para Oliveira). Assim, Oliveira apresentou as
garantias para o banco porque seria o novo responsável pela dívida. Contudo, o documento de que
fala o ministro, de 12 de agosto de
1996, nada menciona sobre mudança de sócios ou consolidação
de dívida, apenas relaciona as fazendas como nova garantia.
Em agosto, o banco cobrava garantias mais valiosas, pois a dívida
aumentava. Por se tratar de apresentação de novas garantias, o
banco acolheu os bens e concordou em assinar o papel, por meio
de dois representantes: o gerente-geral interino, José Ferreira Neto,
e a gerente de negócios interina,
Marilda Okamura Abensur.
Relatórios do Basa contrários à
saída de Jucá da empresa mostram que dificilmente a instituição assinaria documento que tratasse de "transferência de cotas" a
Oliveira, como diz agora Jucá.
A principal evidência de que o
banco nunca aceitou, por escrito,
a transferência das cotas foi produzida pelo próprio ministro. Em
maio de 2004, ele abriu uma ação
judicial contra o Basa na Justiça
de Belém justamente com o objetivo de que o banco reconhecesse
a transmissão das cotas para Oliveira, livrando o ministro do ônus
da fiança e da responsabilidade
pelo débito. Caso fosse correta a
tese de que Jucá assinou o documento de transferência de cotas
"com o banco" no momento em
que Oliveira incluiu suas fazendas
como garantia, simplesmente seria desnecessária a ação que ele
próprio moveu anos depois.
Texto Anterior: Painel Próximo Texto: Outro lado: Ministro evita comentar caso em entrevista coletiva Índice
|