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CELSO PINTO
Os juros e a política
O presidente Fernando Henrique Cardoso comentou com
auxiliares que o ideal seria
ver os juros baixarem para
18% o mais rápido possível. O
ministro do Planejamento,
Antonio Kandir, tem repetido
que os juros podem cair para
20% em meados do ano.
O Banco Central, que, teoricamente, dá a palavra final
sobre os juros, tem reafirmado
com ênfase que os juros só cairão o que for tecnicamente
possível e não o que for politicamente desejável. Com ou
sem aumento do desemprego.
Os cálculos técnicos, infelizmente, não chegam aos 20%
de Kandir e ficam longe dos
18% do presidente. Será que o
BC terá autonomia para continuar definindo os juros?
O presidente, até agora, tem
mantido uma tradição de respeito aos argumentos técnicos
sobre os desejos políticos.
Num ano eleitoral seria delicado deixar o mercado imaginar que a vontade política
prevalecerá. Mas que razões
técnicas impediriam uma redução mais forte da taxa de
juros?
O ex-presidente do BC, Gustavo Loyola, faz uma conta de
chegar. O primeiro constrangimento é o fato de que o Brasil precisa continuar atraindo
recursos externos para financiar suas contas. Os juros, portanto, têm que ser competitivos, não só para continuar
atraindo dólares, mas também para evitar que capitais
brasileiros saiam em busca de
alternativas mais interessantes.
Este piso de competitividade
é fácil de medir. O investimento internacional considerado de maior qualidade e
menor risco são as Letras do
Tesouro americano, que estão
oferecendo algo em torno de
6% ao ano. Como o Brasil não
é os Estados Unidos, é preciso
oferecer um prêmio para convencer um investidor a botar
seu dinheiro aqui. Esse prêmio, hoje, está entre 3,5% e
4% ao ano.
Portanto, o piso dos juros
parte de algo entre 9,5% e
10% ao ano. O rendimento do
investidor externo no Brasil,
no entanto, é calculado em
dólares. Portanto, é preciso
agregar a desvalorização
cambial, que se tem mantido,
há algum tempo, em torno de
7,5% ao ano.
O piso dos juros, portanto,
subiria para 17% a 17,5%. Só
que esse teria que ser o rendimento líquido do investidor.
Como o Imposto de Renda foi
elevado de 15% para 20%, a
taxa de juros nominal teria
que ficar entre 21% e 22% ao
ano.
Isso sem considerar que o
investidor externo olha, na
verdade, não a desvalorização
que ocorreu no passado (o cupom cambial ex-post) e sim as
cotações do dólar no mercado
futuro (o cupom ex-ante). E
tem havido sempre um prêmio
no mercado futuro, que pode
chegar a 3% a 4% em relação
ao cupom ex-post.
É possível baixar este piso?
É, mas as alternativas não são
simples. O "prêmio Brasil" só
pode cair lentamente. A desvalorização cambial pode ser
desacelerada e alguns economistas, como Edward Amadeo e José Márcio Camargo,
defendem esta hipótese.
Loyola, contudo, é contra.
Seria arriscado sinalizar uma
mudança na política cambial.
Na verdade, o mercado absorveu a idéia do BC de recuperar, gradualmente, a competitividade do câmbio e uma
mudança poderia reavivar temores em relação às contas
externas. Bastou o BC demorar um pouco para dar sua
regular minidesvalorização,
neste mês, para o mercado futuro de dólar ficar mais nervoso e as cotações subirem um
pouco, apesar da avalanche
de dólares que está entrando
no país.
Redução no IR está absolutamente fora de questão, reafirmou o secretário da Receita
Federal, Everardo Maciel, numa entrevista neste final de
semana. O BC vender mais
dólares no mercado futuro
para reduzir as cotações não
mudaria o piso.
Dizer que não há muita alternativa técnica a curto prazo para reduzir os juros abaixo de 21% a 22%, contudo,
não quer dizer que esta situação possa ser mantida indefinidamente. Algo está definitivamente errado quando um
país tem uma inflação projetada em 3% a 4% ao ano e
descobre que o piso dos juros
não pode ser inferior a 21%.
Pode-se até aceitar o argumento de que nada pode ser
feito até que FHC seja reeleito,
mas é impossível impedir que
se especule em relação ao rumo de seu segundo mandato.
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