São Paulo, domingo, 31 de maio de 1998

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DATAFOLHA
Grupo palaciano passa rapidamente do "já ganhou" para o temor de 2º turno e até de derrota do presidente
Planalto já não vê reeleição assegurada

CLÓVIS ROSSI
GILBERTO DIMENSTEIN
do Conselho Editorial


O segundo mandato para o presidente Fernando Henrique Cardoso já não está garantido. Essa avaliação está sendo feita pelos analistas de pesquisa do próprio governo, conforme a Folha apurou, e foi enormemente reforçada pelo fato de pesquisa do Datafolha, ontem divulgada, ter mostrado um empate estatístico entre FHC e Luiz Inácio Lula da Silva.
É uma fortíssima inversão de ambiente entre o grupo palaciano, que, até há pouco, vivia um "já ganhou" tão vigoroso que qualquer proposta para que a campanha de FHC fosse ao menos estruturada era descartada pelo próprio presidente.
"É coisa para depois da Copa do Mundo", chegou a dizer FHC, quando pesquisadores como Antônio Lavareda apontavam o surgimento de algumas nuvens negras no horizonte da candidatura de Fernando Henrique.
Sintoma eloquente da mudança de humor no círculo palaciano: em vez do "já ganhou", o ministro da Educação, Paulo Renato Souza, comentou com amigos que volta para Washington (onde trabalhava, antes de ser recrutado por FHC), no caso da vitória de Lula.
É uma brincadeira, claro, pois é muito cedo para que qualquer pessoa comece a pensar no dia seguinte a uma eleição que ainda está a quatro meses de distância. Mas é uma brincadeira reveladora de como foi arquivada, tanto no PSDB, o partido do presidente, como no Palácio, a idéia de que a vitória viria já no primeiro turno.
Das análises feitas pelo círculo íntimo do presidente, ganha ênfase "a maldição de maio", expressão ouvida pela Folha para designar dificuldades que o governo FHC enfrentou em todos os meses de maio, desde a posse.
A maior delas foi em 1996, com o reflexo em sua popularidade provocado pelo massacre de um grupo de sem-terra em Eldorado do Carajás (PA), ocorrido em 17 de abril.
Foi esse fato que fez cair a popularidade do presidente a seu nível mais baixo nas pesquisas de opinião pública feitas em maio de 96. Mas ainda era o suficiente para lhe assegurar a vitória no primeiro turno, cenário que só a pesquisa de maio do Datafolha desfaz, pelo menos provisoriamente.

O possível e o sonho
O principal fator, apesar na queda de FHC, sempre segundo os analistas palacianos de pesquisas, seria a sua insistência em falar na "utopia do possível", em vez de propor um novo sonho ao eleitorado.
Propor apenas consolidar o Plano Real parece não mais bastar, um dado que é confirmado por outra pesquisa, conduzida pelo Ibope, por encomenda da CNI (Confederação Nacional da Indústria).
Em janeiro, 36% dos pesquisados apostavam em que o Real seria um sucesso contra apenas 13% que temiam um fracasso. Em maio, subiu para 21% a porcentagem dos que receiam um fracasso e caiu para 33% a dos francamente otimistas.
Uma segunda pesquisa da CNI, sobre a expectativa dos consumidores, vai na mesma direção: a expectativa negativa atingiu, em maio, seu ponto mais alto desde que os dados são compilados (1996).
As razões para esse desconforto, voltando aos analistas palacianos, vão desde os reajustes reduzidos para o salário mínimo e para as aposentadorias (sempre em maio) até a imagem de que o presidente fica tomando champanhe no exterior enquanto Roraima pega fogo ou o Nordeste verga sob a seca.
Há até, no círculo íntimo do presidente, quem culpe a burguesia, que estaria brincando, conforme análise ouvida pela Folha. Parte da suposta brincadeira seria a desatenção para com a exacerbação de demandas sociais, maximizadas pela mídia, que, sempre por essa análise, seria parte da burguesia.



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