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NORDESTE
Desnutrição, como a sofrida por flagelados do Nordeste, pode causar distúrbios e afetar a próxima geração
Dieta "monótona' pode provocar demência
FABIANA PEREIRA
ELAINE KAWAGOE
da Agência Folha
Pessoas com
dieta "monótona", deficiência
de vitaminas do
Complexo B e
de alguns sais
minerais por
um logo período de tempo podem evoluir para
um estado de demência, que é
"confundido" com loucura.
É o que afirma a médica Roseli
Saccardo Sarni, diretora-técnica
do Núcleo de Nutrição da Secretaria do Estado de São Paulo.
Ela explica que, no período de
até dois meses, uma pessoa que
tem uma dieta pobre ou "monótona" (somente feijão, por exemplo) pode apresentar a demência,
se não tiver reservas de nutrientes
acumuladas suficientes para impedir isso. A ausência prolongada
de nutrientes pode provocar a parada cardíaca em bebês.
"A demência é um estado parecido com o da loucura. Há perda
de memória, mania de perseguição e perturbação mental", diz.
"A pessoa faz coisas que não deveria ou não poderia fazer."
A pelagra, como é chamada a deficiência de vitaminas, causa a demência. Segundo Sarni, era uma
ocorrência comum em áreas da
África com problema de fome.
O psiquiatra Carlos David Segre,
60, do Serviço de Psicoterapia do
Hospital das Clínicas de São Paulo, diz que o estresse da condição
social dos flagelados da seca e a fome afetam a mente dessas pessoas.
Segundo ele, os distúrbios mentais causados pela fome podem ser
tratados. "Mas não adianta fazer
um tratamento mais sofisticado se
não houver condições básicas de
saúde em primeiro lugar. Esses
pacientes precisam ter cuidado
com suas condições físicas e biológicas antes de mais nada."
Segre disse ainda que "não é de
estranhar" que os sintomas retornem quando as pessoas, depois de
internadas no hospital e "curadas", voltem, mais tarde, a apresentar os mesmos sintomas de
agressividade e confusão mental.
"Se em casa eles não têm continuidade do tratamento recebido,
da alimentação, por exemplo, os
problemas voltam."
Distúrbio psicossocial
O cardiologista Abrão José Cury
Jr., do Hospital do Coração de São
Paulo, disse que distúrbios como
agressividade, perda de senso crítico ou o ato de falar sozinho são
um tipo de distúrbio psicossocial,
no caso dos flagelados da seca.
"Quando o organismo fica sem
energia, é ativado o mecanismo de
sobrevivência. O corpo tenta de
toda forma lutar e, somado o fator
psicossocial, acaba gerando atitudes agressivas", disse.
A desnutrição ocasionada pela
seca no Nordeste também causará
problemas na próxima geração.
Para Franco Lajolo, 57, chefe do
departamento de alimentação e
nutrição experimental da USP, os
fetos cujas mães estão sofrendo de
desnutrição crônica podem nascer
com deficiência no sistema nervoso e problemas neuromotores.
Colaborou
Fabiano Maisonnave, free-lance
para a Folha
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