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LOUCURAS DA FOME
Fome leva mulher a tentar comer gilete
"Fico querendo me
vingar do mundo'
da Agência Folha, em Ouricuri
Maria Cleonice Souza Silva, 22,
diz que não suporta mais a miséria e a fome e afirma que é "capaz de fazer qualquer coisa"
quando se revolta por falta de
comida e de trabalho.
Maria Cleonice está desempregada e mora com os pais e seis
irmãos em uma casa de
pau-a-pique, no vilarejo de Santa Rita, distrito de Ouricuri, sertão de Pernambuco.
Ela diz que fica até três dias
sem comer e que, quando isso
acontece, sente dores de cabeça e
se torna violenta. "Já fui para cima da minha mãe, tentei comer
gilete, tomei água sanitária."
Filha de um agricultor também
desempregado, Maria Cleonice
diz que gostaria de comer alface,
cenoura, queijo e beterraba,
"essas coisas que as outras pessoas comem".
Desde o agravamento da seca
no Nordeste, ela já saiu de casa
quatro vezes, na tentativa de melhorar de vida. Quando volta
sem nada, diz o pai, Raimundo
Miguel da Silva, "sai quebrando
tudo por aí".
A seguir, os principais trechos
da entrevista de Maria Cleonice à
Agência Folha.
(FÁBIO GUIBU)
Agência Folha - Como é a sua
vida aqui?
Maria Cleonice Souza Silva - É
muito ruim. Às vezes fico três
dias sem comer. Aí começa a dar
uma dor de cabeça, fico querendo me vingar de todo mundo.
Agência Folha - Seus pais dizem que, quando não há comida,
você fica violenta. Por quê?
Maria Cleonice - Minha casa é
fraca, não tem comida, não consigo emprego. Já fui presa porque dei na cara de uma mulher e
fugi da cadeia. Quando eu fico
revoltada não vejo nada, sou capaz de fazer qualquer coisa.
Agência Folha - Você é capaz
de fazer o quê?
Maria Cleonice - Tudo. Já fui
para cima da minha mãe, tentei
comer gilete, tomei água sanitária, quebrei televisão, radiola,
coloquei fogo na cerca.
Agência Folha - O que você
gostaria de comer?
Maria Cleonice - Eu queria comer alface, queijo, cenoura, beterraba, essas coisas que as outras pessoas comem. Eu só me dou com cmida boa. Não dá para ficar só comendo arroz ou feijão velho.
Agência Folha - Você não come carne há quanto tempo?
Maria Cleonice - Um dia eu peguei uma galinha do meu avô, mas ele reclamou. Aí eu fiquei nervosa e coloquei veneno na água das galinhas para matar todas.
Agência Folha - Por que você age assim?
Maria Cleonice - Já fui internada no Crato porque as pessoas pensam que eu sou louca, mas eu não sou. Só sou revoltada, muito revoltada.
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