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JANIO DE FREITAS
A crise das ambições
O Lavoisier escolar já entrou em cena: na política,
nada se cria, nada se perde, tudo
se transforma. De caça às ambições financeiras desregradas, a
crise passa a ser, também, ambiente manipulado por ambições
voltadas para a eleição presidencial do ano que vem.
Nesse sentido formou-se, há
quase duas semanas, um eixo de
operação Brasília-Rio, mas sem
que isso signifique a participação
de pretensos pré-candidatos cariocas ou fluminenses.
Os dados da equação começam
a aparecer na terça-feira 19, com
uma visita do deputado Roberto
Jefferson à casa, em Brasília, do
senador Jorge Bornhausen, presidente do PFL.
Nada dessa conversa passa ao
noticiário, como seria normal em
encontro tão incomum e, ainda
mais, em fase de tanta excitação
jornalística. Na quarta, Jorge Bornhausen viaja ao Rio, para conversas na área de imprensa. Viaja
pouco menos do que incógnito.
Na quinta, sua viagem é retribuída com a viagem a Brasília de seu
ou seus principais interlocutores.
Nos dias subseqüentes surgem
algumas notícias com jeito esquisito, sobre relatórios que não se
comprovam onde foi noticiado
que existem; iniciativas cujos personagens as negam, e por aí.
Nesses períodos em que a imprensa abre mão de maiores exigências, levada pela ânsia que
acomete os repórteres e seus editores, mesmo para jornalistas é
difícil distinguir o que vale no noticiário, quanto mais para o leitor/espectador.
E assim chegamos à eminência
de Nelson Jobim, presidente do
Supremo Tribunal Federal, nem
por isso menos político do que antes de receber de Fernando Henrique a condição da magistratura.
Segundo a notícia no "Globo",
Jobim está "advertindo [líderes
dos partidos] de que o país ficará
ingovernável nos próximos dez
anos se a oposição tentar derrubar" Lula. Por que dez anos, não
foi esclarecido. Mas, teria dito Jobim, "ninguém pode impedir que
o presidente da República seja
julgado pelo povo. Se isso [o impedimento] ocorrer, ninguém terá
condições de governar o país".
As recomendações de Jobim à
contenção dos oposicionistas e à
moderação nos discursos de Lula
conduzem, diz o texto, à sugestão
de que "os partidos de oposição se
sentem à mesa com o presidente
Lula e busquem um entendimento prévio para assegurar que o
presidente eleito em 2006 tenha
condições mínimas para administrar".
Está aí pressuposto, com toda a
clareza, que "o presidente eleito"
não é "presidente reeleito". Nada
a ver com a posição que o senador
Eduardo Suplicy volta a manifestar, contrária por princípio à recandidatura de Lula, como o foi
publicamente contra a de Fernando Henrique.
Nada a ver, também, com a
proposta do senador Jefferson Peres, que consiste em um pacto dos
maiores partidos para evitar a expansão da crise à economia e à
administração.
Por acaso ou não - a melhor
aposta é na segunda hipótese -,
a repentina participação de Nelson Jobim, com o peso do STF mas
também com sua reputação de
pretendente à Presidência da República, coincide plenamente
com os indícios de uma articulação em andamento subterrâneo.
Pelos propósito dessa articulação, a crise ficaria circunscrita
aos partidos e ao Congresso, assegurando-se a Lula a preservação
das condições integrais do exercício presidencial. De sua parte, Lula daria por encerrada a sua Presidência no primeiro mandato.
Poderia ser feito então, por
exemplo, o entendimento por
uma candidatura com a chancela
elevada do suprapartidarismo,
ou coisa que o valha, para recompor a nação etc. e tal.
A contrapartida desejada de
Lula não deixa de ser uma forma
de impeachment com prazo de
carência. Por isso mesmo, talvez
funcione mais como constrangimento do que como estímulo para um possível gesto coerente de
Lula, amparado na oposição rígida que fez ao projeto de reeleição.
No público, a crise é tratada pelo ângulo da corrupção. Entre os
políticos, a crise é considerada pelo ângulo da eleição.
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