São Paulo, sexta, 31 de julho de 1998

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CELSO PINTO
Uma ponte para a eleição

O sucesso além do esperado no leilão da Telebrás ajudou a tranquilizar o cenário das reservas externas até a eleição presidencial. Salvo uma crise surpresa, vinda da bolsa americana ou da Ásia, não deverá haver sobressaltos.
O potencial de saída de recursos de curto prazo é enorme, algo como US$ 13 bilhões, o que poderia causar alguma turbulência em agosto e setembro. Em contrapartida, entrarão os mais de US$ 5 bilhões gerados pela Telebrás, mais os US$ 2,5 bilhões a US$ 3 bilhões da venda do Excel-Econômico para o BBV e do Real para o ABN.
Outro fator positivo é que não tem havido saídas tão fortes de dólares especulativos pelo câmbio flutuante. E a nova redução dos juros, para 19,75%, não deve ter um impacto negativo, porque o cupom cambial de longo prazo, que mede a remuneração do investidor externo, se manteve em torno de 11%.
A razão para esta mágica é que, ao mesmo tempo em que caiu o juro, também caiu a cotação do dólar no mercado futuro. O cupom é formado pelos juros menos o custo da desvalorização projetada.
Outro ponto positivo poderá ser o mercado de ações, se a venda da Telebrás gerar um clima de otimismo que volte a atrair dólares. Ontem, foi dia de euforia nas bolsas e não faltava quem concluísse que o Brasil se distanciou, de vez, dos outros emergentes problemáticos. As inconsistências fiscais e das contas externas brasileiras, contudo, persistem e é cedo para falar em mudança mais profunda de humor.
Não há dúvida, contudo, que o sucesso da Telebrás veio em hora estratégica para o governo. O mercado calcula que existem US$ 5 bilhões em "notes" (títulos externos de curto prazo) vencendo neste segundo semestre. Além disso, da famosa "63 caipira" (usada para aplicações especulativas de curto prazo), existem US$ 5 bilhões vencendo em agosto/setembro e mais US$ 3 bilhões vencidas, que estão sendo roladas no "overnight".
Portanto, são cerca de US$ 13 bilhões que podem sumir rapidamente. Em julho, antes da Telebrás, as contas das reservas caminhavam para uma perda em torno de US$ 1 bilhão. Já na quarta-feira, contudo, entrou mais de US$ 1 bilhão pelo câmbio livre financeiro (da Usinor, ou de consórcios da Telebrás). E mais de US$ 5 bilhões virão para a Telebrás nos próximos dias, ajudando as contas de julho ou agosto.
Igualmente importante tem sido a melhora da expectativa nos mercados futuros de dólar e juros. O Banco Central tem ajudado, oferecendo títulos indexados ao dólar.
Os juros de um ano, que há algumas semanas chegaram a superar 30%, ontem estavam em 23%. Ao mesmo tempo, contudo, a desvalorização implícita para um ano também recuou de forma significativa.
No início de abril, a desvalorização implícita estava em 11,9%. Ela subiu a 12,4% no início de maio e disparou para 16,5% no começo de junho, quando a Ásia e a Rússia voltaram a preocupar. No início de julho, ela ainda estava em 15%. Nesta semana, contudo, já havia recuado para 11%, nível equivalente ao de pouco antes da crise de outubro do ano passado.
Uma desvalorização desta ordem ainda embute um prêmio significativo (uns 4%) em relação ao ritmo atual de desvalorização anual (em torno de 6,5% a 7%). O prêmio efetivo pode se revelar maior, se o BC desacelerar a desvalorização cambial, como parte do mercado aposta.
O fato é que, graças a este recuo, o cupom cambial longo (um ano), que era de 11% em abril e subiu a 12,5% em junho (pelo aumento nos juros), voltou a 11%. O ritmo de saída pelo câmbio flutuante em julho tem ficado abaixo do esperado: uma média diária de US$ 73 milhões, menor que os US$ 99 milhões de junho, sinal de que não há corrida para tirar dólares aplicados em renda fixa.
A soma destes fatores tiram a preocupação imediata do mercado com o nível de reservas, mesmo sabendo que elas deverão cair até o final do ano. Pode haver espaço, portanto, para alguma redução adicional de juros antes da eleição.
A má notícia é o déficit na balança comercial de US$ 386 milhões em julho (até quarta-feira), muito acima do esperado. O governo diz que houve problemas nos registros. A média de exportações, de todo modo, vem caindo e, se a economia retomar algum crescimento, os déficits comerciais deverão engordar.
A esperança do governo é que o problema só apareça depois de FHC estar eleito.




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