São Paulo, Domingo, 31 de Outubro de 1999
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JANIO DE FREITAS
Tudo pelas galinhas

Vá lá que a Embaixada dos Estados Unidos, que nem embaixador tem, se meta a condenar a Justiça brasileira, e o governo -refiro-me ao nosso, que é sobretudo deles- não cumpra o seu dever constitucional de repelir a intromissão. Mas que não defenda com a devida energia as nossas galinhas, aí, concordemos com Itamar Franco, é a inércia dos covardes.
Deu-se que um jornal inglês, o "Daily Mail", importante pela alta vendagem inversamente proporcional à qualidade, publicou anúncio de página inteira contra as nossas galinhas. Comê-las seria correr o risco de contrair certas doenças. Os ingleses, está-se vendo, continuam não sabendo de nada. Mas o fato é que na famosíssima "Marks & Spencer", por exemplo, diz o anúncio que não se encontra mais galinha brasileira.
Parece incrível que em algum lugar da Europa não se encontrem galinhas brasileiras, para todos os gostos e preços. Nem mesmo a penetração das galinhas asiáticas abalou o prestígio das nossas (a propósito, o anúncio sugere que os ingleses não comam também as tailandesas). Prestígio, porém, há que o defender sempre, ou se esvai.
Por isso é inaceitável que a reação do governo brasileiro se tenha resumido a uma carta do ministro Pratini de Moraes às autoridades sanitárias inglesas, assegurando-lhes que os ingleses podem pagar sem receio para comer galinhas brasileiras, que nossas galinhas são muito boas. Ora, que são boas todo mundo sabe.
É preciso defendê-las, despertar os nossos diplomatas, consultar publicitários com a experiência de Roberto Justus para uma campanha pelas galinhas brasileiras. Lá fora, elas são a mais notória marca registrada do Brasil. Nas exportações brasileiras mais destacadas, as galinhas estão ao lado do café, do minério de ferro e dos travestis.
Em tempo: a menção à ausência de embaixador dos Estados Unidos no Brasil, há mais de um ano, é meio imprópria. Os americanos têm embaixador, sim. Fica no Planalto.

Inocências
O Tribunal de Contas da União levou meio ano para inocentar Mendonça de Barros e André Lara Resende do que não estavam acusados. Sempre ficou claro não terem eles influído no resultado do leilão que entregou a Telerj ao consórcio Telemar.
Muito ao contrário, esse resultado foi o imprevisto. O consórcio representado por Pérsio Arida, que deveria ficar com a Telerj, também por imprevisto antes comprara com outra das teles. Como o acúmulo fosse proibido, a Telerj foi parar com o grupo que ninguém, muito menos Mendonça, Lara e Arida, imaginara. Ou desejara.

Entreguismo
A explicação de Andrea Calabi para a mudança de regra na privatização da Cesp em cima da hora é, no mínimo, ridícula. Ao estender, de repente, a estrangeiros o financiamento, pelo BNDES, de metade do preço, Calabi liquidou o pretendente brasileiro e diz que mudou a regra "para salvar o leilão".
Além disso, o que Calabi tira de projetos brasileiros para financiar o comprador, o poderoso grupo americano AES, é mais do que esse grupo "pagará" acima da proposta do segundo colocado. Na diferença vencedora, o Brasil recebe menos do que põe.
Na privatização brasileira não basta entregar as empresas, entrega-se também o dinheiro. Inclusive o que enche as burras do BNDES com o Fundo de Amparo ao Trabalhador, que desse fundo não vê centavo.
Quem quiser achar que isso tudo acontece por ingenuidade, ou incompetência, continua com liberdade de fazê-lo.



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