São Paulo, Domingo, 31 de Outubro de 1999
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CELSO PINTO
Europa negocia livre comércio

Frankfurt - No final de novembro, a União Européia (UE) fará talvez a última rodada de negociações para um acordo de livre comércio com o México. As negociações estão muito avançadas e a intenção é fechar o acordo antes do final do ano.
Se der certo, será o primeiro acordo desse tipo da UE com um país latino-americano. Negociado num tempo muito curto: as conversas começaram há um ano, em novembro de 1998.
Os mexicanos querem terminar a negociação até dezembro para não misturá-la com as eleições presidenciais do próximo ano. A UE também quer concluí-la neste ano para evitar que ela atropele a Rodada do Milênio da Organização Mundial de Comércio (OMC), cujo pontapé inicial será dado em novembro, em Seattle.
Para o Mercosul, que, em junho, decidiu iniciar negociações para um tratado de livre comércio com a UE, na reunião de cúpula do Rio de Janeiro, um sucesso no acordo com o México será um bom sinal. Mostrará o quanto interessa à Europa marcar presença na região.
"Não queremos deixar os americanos sozinhos", diz Wolfgang Hantke, chefe do Departamento de Relações com a América Latina do Ministério da Economia e Tecnologia da Alemanha, em Berlim. Os Estados Unidos gostariam de concluir um acordo de livre comércio (Alca) com a América Latina até 2005. Hantke acha que é possível a Europa concluir seu acordo de livre comércio com o Mercosul até 2004.
No caso do México, existiram duas boas razões para a rapidez das negociações. Uma é a experiência mexicana em negociações desse tipo, a partir do Nafta, o acordo de livre comércio com a América do Norte. Hoje, graças ao Nafta, de 80% a 90% do comércio exterior mexicano é feito com os Estados Unidos. O acordo com a UE ajudará a reduzir um pouco essa dependência.
A outra razão, muito importante, é que o México não tem problemas para negociar produtos agrícolas com a UE. Na verdade, o México é importador líquido de alimentos da UE e seu principal interesse nas negociações está na área industrial.
Os europeus, como se sabe, têm uma poderosa rede de proteção agrícola e, especialmente por pressão francesa (mas também da Espanha e de Portugal), relutam em reduzir tarifas e eliminar barreiras não-tarifárias nessa área. Esse é o ponto nevrálgico das negociações da UE com o Mercosul e foi a razão para o quase fracasso da reunião do Rio.
A outra dificuldade nas negociações de um acordo de livre comércio com o Mercosul será o setor de serviços. Hantke lembra que Espanha e Portugal relutam em liberalizar a aceitação mútua de profissionais liberais, como médicos e dentistas, pelo medo da pressão latino-americana em seus mercados de trabalho.
Hantke diz que o acordo com o México vai prever períodos de transição para a eliminação de tarifas para várias indústrias mexicanas, como automobilística, de calçados e têxtil. Pelas regras da OMC, um tratado regional ou bilateral de livre comércio deve abranger "praticamente todo o comércio" para ser aceito, o que interpreta-se como cerca de 90% do comércio. O período de transição para a liberalização, por sua vez, deve ser, no máximo, de dez anos.
Na negociação com o Mercosul, aceitou-se começar pela discussão de barreiras não-tarifárias (regulação, normas, licenças etc.). A discussão sobre tarifas industriais e agrícolas só começará em 2001. Hantke acha que as negociações serão complicadas, especialmente na área agrícola, mas está otimista.
A Alemanha foi um importante aliado do Mercosul na reunião do Rio e está muito interessada no acordo. Seu principal parceiro na América Latina é o Brasil, para quem a Alemanha vendeu, no ano passado, 9,6 bilhões de marcos (US$ 5,3 bilhões) e de quem comprou 6,7 bilhões de marcos (US$ 3,7 bilhões). Para toda a América Latina, a Alemanha exporta 30 bilhões de marcos (US$ 16,6 bilhões) e importa 17 bilhões de marcos (US$ 9,4 bilhões). A América Latina representa apenas 3,8% do comércio global alemão.
Nas relações com o Brasil, Hantke diz que existe grande potencial para aumentar investimentos de pequenas e médias empresas alemãs. A Alemanha reclama, contudo, que o acordo de proteção de investimentos, assinado pelos dois governos, está parado há dois anos no Senado brasileiro à espera de ratificação.
O tratado garante tratamento nacional para as empresas dos dois países em matéria de tarifas, impostos, subsídios e assegura compensação em caso de expropriação. A Alemanha já tem acordos desse tipo com a Argentina, Chile e México.


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