São Paulo, terça-feira, 31 de outubro de 2000

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RECIFE
Para João Paulo, "povo quer mudar a política econômica", o que "interferirá na sucessão de 2002"; apesar de defender o socialismo cubano, ele deixa claro que não defende uma revolução socialista
Vitória do PT é recado para FHC, diz eleito

KENNEDY ALENCAR
ENVIADO ESPECIAL A RECIFE

FÁBIO GUIBU
AGÊNCIA FOLHA, EM RECIFE

O prefeito eleito de Recife, João Paulo, diz que a vitória do PT em seis capitais é um "recado para o governo Fernando Henrique Cardoso". Para ele, "o povo quer mudar a política econômica", o que "interferirá na sucessão de 2002".
Ex-metalúrgico e ex-dirigente sindical, lidera uma microtendência do PT de Recife, a FAS (Fórum de Articulação Socialista). Defende o socialismo cubano e tergiversa ao ser indagado se julga Fidel Castro um ditador. "O povo de Cuba fez uma opção política."
O petista, que iniciou a carreira política em 1972, no regime militar, militando na Juventude Católica Operária, deixa claro que não defende uma revolução socialista. É filho de um ex-cobrador da companhia de ônibus municipal que foi privatizada pelo adversário na eleição, o prefeito Roberto Magalhães (PFL). Adepto da meditação transcendental e da alimentação macrobiótica, deu entrevista à Folha ontem na Assembléia Legislativa, onde ocupa uma vaga de deputado desde 1990. Dois anos antes, havia sido o primeiro vereador eleito do PT na cidade. Hoje, ele completa 48 anos.

Folha - O PT ganhou em seis capitais e teve bom desempenho até onde perdeu. Qual o motivo do resultado e o significado para 2002?
João Paulo -
O povo quer mudar a política econômica, quer um redirecionamento que garanta maior distribuição de renda. Os governos de direita vão ter de aprender com o fracasso das administrações voltadas contra o povo e, em muitos casos, como a de Maluf em São Paulo, marcada pela corrupção. Tudo isso vai interferir na sucessão presidencial de 2002 e é um recado para o governo Fernando Henrique Cardoso e suas forças de apoio.

Folha - Faz sentido a avaliação de que, se forem bem administradas, as prefeituras conquistadas serão a vitrine do partido para 2002, mas, se forem mal, prejudicarão daqui a dois anos?
João Paulo -
Não vejo essa relação.

Folha - Mas o sr. acabou de dizer que houve um efeito negativo federal na eleição municipal. Não poderá haver o inverso?
João Paulo -
Claro que os prefeitos eleitos vão procurar ao máximo fazer uma boa administração. Se administrarmos com transparência e ética e ainda assim surgirem dificuldades, estará caracterizado que essas dificuldades são fruto de uma política econômica do governo federal. Logo, o PT terá discurso para 2002, mostrando a importância de se mudar a economia nacionalmente. O eleitor saberá fazer distinção.

Folha - O sr. acha que quebrou de vez a hegemonia do grupo político que vinha se revezando no poder municipal há 12 anos, alternando PFL e PMDB?
João Paulo -
Uma vitória eleitoral não significa uma consolidação política, como mostrou o governo de Miguel Arraes (PSB, eleito em 1994 e derrotado em 1998). As forças de direita continuam articuladíssimas. Vamos estabelecer uma relação democrática. Entender que a direita tem peso em nossa cidade, com uma eleição tão dividida. Procurarei alguns setores não raivosos.

Folha - O sr. defende o socialismo cubano?
João Paulo Lima e Silva-
Não existe socialismo cubano. Existe o socialismo. Considero-me um socialista. O modelo de desenvolvimento capitalista tem se mostrado incompetente para resolver os problemas da humanidade. Defendo um modelo socialista democrático, do qual estamos sem referência internacional, mas um socialismo marcado pela liberdade de expressão e de pensamento.

Folha - Cuba tem um regime de partido único e não há liberdade de expressão.
João Paulo -
Não deixo de reconhecer os avanços da sociedade cubana, apesar de todo o boicote. Nas Olimpíadas, Cuba teve onze medalhas de ouro, um país pobre, com tanta dificuldade como aquele, enquanto o Brasil, a oitava economia do mundo, teve resultado tão catastrófico.

Folha - Mas e a liberdade política. O sr. não considera Fidel Castro um ditador?
João Paulo -
O povo de Cuba fez um opção política por Fidel.

Folha - Pelo que diz, o sr. não defende uma revolução para se chegar ao socialismo. Isso não é ser social-democrata?
João Paulo -
O que estabelece socialismo é uma relação social. Hoje, não cabe pensar em revolução que o Brasil ou qualquer país conseguirá um processo de transformação significativa sem levar em consideração o planeta. Há uma internacionalização evidente da economia, mas, a partir das administrações, pode se melhorar a qualidade de vida do povo.

Folha - Qual é o saldo da greve da PM?
João Paulo -
Extremamente negativo. A população foi prejudicada e perdeu muito. Perdeu o setor empresarial, por conta da desordem estabelecida, da falta de proteção. Entendemos a reivindicação e entendemos que o direito de greve dos policiais é um direito justo, mas somos contra o caos. O governo foi incapaz de resolver esse problema. Nunca se teve uma greve tão anunciada.


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