Campinas, Domingo, 9 de agosto de 1998

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ENTREVISTA DE DOMINGO
Carlos Gomes não foi reconhecido, diz secretário

free-lance para a Folha

O secretário da Cultura de Campinas, João Plutarco Rodrigues de Lima, fala, em entrevista à Folha, que a população de Campinas não deu a devida importância para o compositor, que fez fama e dinheiro na Itália e acabou sendo reconhecido em Belém (PA), onde morreu.
O secretário disse ainda que a Secretaria da Cultura está tentando levar a obra do compositor para outros países e afirmou que tentará transformar a Semana Carlos Gomes em um grande festival.
O Secretário da Cultura reclama do descaso ocorrido na época em que foi construído um prédio no local onde estava a casa em que Carlos Gomes nasceu.

Folha - Qual a importância de Carlos Gomes para Campinas?
João Plutarco Rodrigues de Lima - A importância de Carlos Gomes não é só para Campinas, que foi o berço, a cidade que, naturalmente, pela sua cultura musical, gerou o compositor, que é talvez um dos maiores compositores das Américas. Para Campinas é uma grande honra ter um compositor como Carlos Gomes.
Folha - E para o Brasil também?
Lima - Lógico.
Folha - Por quais lugares ele passou em Campinas antes de ir para a Itália? Onde se apresentou?
Lima - Eu sei, por exemplo, que, infelizmente, por não existir o órgão que preservava o patrimônio cultural, a casa que ele morou na Regente Feijó e que hoje é um prédio. Ali tem apenas uma placa assinalando que existiu uma casa em que ele nasceu. Se existisse o Condepacc (Conselho de Defesa do Patrimônio Artístico e Cultural de Campinas), certamente essa casa teria sido preservada.
Folha - E outros lugares onde ele se apresentou?
Lima - Não sei sobre os outros lugares. Sei apenas que o pai dele chegou a ser o mestre capela, que era o homem que fazia toda música para enterro, solenidades religiosas e ele era um grande maestro também, a ponto de ter sido designado pela igreja como mestre capela e, como se sabe, durante o Império, a igreja tinha um poder muito grande nesse país, porque a igreja estava ligada ao Estado.
Folha - E como Carlos Gomes era tratado na cidade?
Lima - Olha, eu acho que Campinas deve à Carlos Gomes isso que você me perguntou. Eu acho, por exemplo, que Carlos Gomes foi para Belém (PA) certamente porque a cidade lhe deu apoio, lhe deu todo o prestígio, prestígio que ele angariou na Europa.
Para se ter uma avaliação dessa importância, ele conseguiu, como brasileiro, levar uma ópera para o Scala de Milão. E deve ter havido um sucesso enorme, a ponto de o Scala ainda ter hoje, entre seus grandes compositores, a estátua do maestro Carlos Gomes.
Folha - Depois que ele morreu, mudou alguma coisa?
Lima - Olha, eu tenho a impressão de que, após a morte de Carlos Gomes e a transferência e o enterro dele em Campinas, a cidade acordou para o gênio que era seu filho. E eu acho que Campinas deve reverenciar e mostrar a todas as gerações a importância que teve Carlos Gomes. Este ano a Semana Carlos Gomes vai se transformar em um festival. Festival este que eu quero, se depender de apoio da Secretaria de Estado da Cultura, transformar em um evento nacional e até internacional.
Folha - O senhor acha que Campinas dá a devida importância para Carlos Gomes?
Lima - Não. Ela pode não ter dado durante a vida dele aquilo que ele poderia merecer, mas, sem dúvida nenhuma, Campinas está resgatando esta importância que foi a obra dele.
Folha - Mas ainda falta alguma coisa?
Lima - Eu acho que sim. Campinas deve aproveitar esses eventos que irão se realizar e transformar a sua história em internacional.
Folha - E o campineiro? Conhece Carlos Gomes?
Lima - Olha, eu sou cearense, e a obra de Carlos Gomes foi inspirada em um romance de um cearense, que foi o grande escritor José de Alencar. No Ceará nós cantávamos um hino em louvor à Carlos Gomes. Eu acredito que Campinas é uma cidade de tradição lírica muito grande e musical.
Eu desconhecia antes de vir para Campinas qual a importância que a cidade dava antes a Carlos Gomes. Eu vejo se ampliar a cada ano um interesse maior no conhecimento da obra de Carlos Gomes.
Folha - O senhor conhece a história de Carlos Gomes? Como foi sua relação com a família?
Lima - O que eu conheço são de publicações relativamente recentes, inclusive a publicação da Lenita Nogueira. Ela fez uma catalogação de toda a obra. E o que eu conheço também são fatos isolados, fatos que ficaram, digamos assim, não muito esclarecidos, como a morte da mãe dele. São fatos menores que não devem ser relembrados em um momento como este.
Folha - Como Carlos Gomes era tratado no exterior?
Lima - Eu tenho a impressão de que na Itália ele deve ter sido bem tratado, pelo que ele ganhou, pela vida tão faustosa que ele viveu nos arredores de Milão, me parece que ele fez um grande sucesso, inclusive sucesso financeiro.
Folha - E os problemas políticos de Carlos Gomes em Campinas?
Lima - Tem quem especule que Campinas é uma cidade que foi, ao lado de Itu, o berço da República; tem quem diga que Carlos Gomes, por ser um monarquista, não era muito bem visto aqui na cidade.



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