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HISTÓRIAS
Crepúsculo
JOSÉ ALBERTO BOMBIG
Editor-assistente da Folha Ribeirão
Como e com quem cheguei
ao pequeno estádio, não me
lembro, nem interessa tanto.
O que importa é que eu estava
lá, na beira do campo, pronto
para ver de perto mais um
entre tantos jogos em uma
tarde de sol do interior.
Naquele gramado, na zona
rural de São Joaquim da Barra, brancos, pretos e, principalmente, um descendente de
índios, de apelido Garrincha,
correriam atrás da bola.
A data exata também não
me lembro, mas acho que a
década de 70 já findava e
Garrincha, o legendário craque das pernas tortas, enfrentava uma fase difícil, com
pouco dinheiro, muita bebida
e problemas emocionais.
Havia alguns anos ele disputava jogos caça-níqueis, como aquele, pelo país em um
time chamado Milionários,
junto com outros ex-craques.
As pequenas cidades do interior de São Paulo faziam
festa para recebê-los. Garrincha era a principal atração.
Aos meus olhos de moleque,
porém, nem tudo era festa. O
homem de quem tanto falavam os mais velhos me pareceu triste e abatido.
Olhei os pés de Garrincha,
não muito grandes, redondos.
Ele colocava as meias em lento ritual. O craque notou minha presença e sorriu ternamente. Seu aspecto era igual
ao de muitos brasileiros.
Distante de sua melhor forma, dentro de campo, ele se
limitou a ser uma caricatura.
Parecia não querer esconder
a melancólica condição. O
craque do bicampeonato
mundial na Copa do Chile,
em 62, jogava agora em um
estádio com poucas arquibancadas, de madeira, modesto
até para os padrões do interior de São Paulo.
No mais, ninguém havia ido
ao campo esperando ver os
dribles que fizeram dele a
"alegria do povo". Com um
misto de sadismo, felicidade,
dever e complacência, éramos
todos, inclusive eu, apenas
testemunhas do crepúsculo
trágico de um grande astro.
Poucos anos depois, em janeiro de 83, ele estaria morto.
Após aquele dia, passei a entender melhor a dimensão de
Garrincha e um pouco mais a
tragédia humana.
A glória, o fracasso e a eternidade do mito. Tudo ali, naquele momento em que Garrincha colocava calmamente
a meia, já se preparando para
virar imortal...
E-mail:²jafbombig@uol.com.br
José Alberto Bombig escreve aos domingos
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