São Paulo, sexta-feira, 01 de outubro de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Efeito é psicológico, afirma cientista

CLAUDIO ANGELO
EDITOR DE CIÊNCIA

A decisão de Vladimir Putin de encaminhar o Protocolo de Kyoto para ratificação pelo Parlamento foi comemorada por ambientalistas, que vêem nela a salvação do único acordo internacional já concebido capaz de lidar -ainda que de forma tímida- com o problema do aquecimento global.
Cientistas ouvidos pela Folha, no entanto, pedem cautela: para eles, a ratificação de Kyoto terá um efeito sobretudo psicológico, e as negociações estão tão atrasadas que até mesmo a meta de cortar 5,2% das emissões dos países industrializados entre 2008 e 2012 pode não ser cumprida.
"Se for levada adiante, a decisão russa terá um efeito psicológico", disse o climatologista Peter Stone, do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts), nos EUA.
É uma sinalização de que o resto do mundo está disposto a encarar a tarefa de mitigar o efeito estufa, apesar da resistência americana.
Stone diz, no entanto, que o protocolo tem diversas falhas estruturais -se omite, por exemplo, em relação à questão dos aerossóis, fontes importantes de aquecimento-, que deveriam ser resolvidas no segundo período de redução, a partir de 2012.
"Mas a demora atrasou o processo para o segundo período."
Para o físico José Goldemberg, secretário do Meio Ambiente do Estado de São Paulo e um dos principais negociadores brasileiros de Kyoto, vai haver uma corrida dos países ricos para reduzir as emissões num período curto demais -e a meta inicial de Kyoto provavelmente não será cumprida. "Já se perdeu muito tempo."
Goldemberg afirma ainda que a eventual entrada em vigor em 2005 (a previsão inicial era 2002) também deve colocar pressão sobre o Brasil: no segundo período, países do Terceiro Mundo também devem assumir compromissos de reduzir emissões. No caso brasileiro, o desmatamento da Amazônia (que joga cerca de 200 milhões de toneladas de carbono na atmosfera todo ano) é o alvo.
A UE, a ONU e o movimento ambientalista comemoraram a decisão. "Num momento em que a Terra é fustigada por crescentes tempestades, o presidente Putin nos trouxe a um ponto crucial na história humana hoje", disse Steve Sawyer, do Greenpeace. "A administração Bush ficou sozinha na lama e o resto dos governos do mundo podem caminhar para enfrentar a mudança climática."
O diretor do Programa das Nações Unidas para o Ambiente, Klaus Töpfer, deu "calorosas boas-vindas" à atitude russa e alfinetou os EUA: "Outros países que têm sido, como a Rússia, reticentes, agora vão se unir, espero, aos esforços da comunidade internacional", escreveu.
"É ilusão achar que os EUA voltarão a Kyoto, não importa quem vença a eleição", disse o físico Luiz Gylvan Meira Filho, da USP, que foi convocado pelo governo britânico para um painel que debaterá a ciência do efeito estufa.


Texto Anterior: Rússia aprova acordo contra efeito estufa
Próximo Texto: Análise: "Fazer as pazes" com Ocidente motiva Putin
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.