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Índios ganharão para preservar floresta
Reserva tembé, no Pará, deve fechar contrato para emitir créditos de carbono em troca de cerca de R$ 1 milhão por ano
Negócio em mercado fora
do acordo de Kyoto sobre
efeito estufa vai contra a
posição do governo, que
teme estímulo ao desmate
JOÃO CARLOS MAGALHÃES
DA AGÊNCIA FOLHA, EM BELÉM
Os índios tembés, que vivem
no Pará, pretendem fechar até
o final de maio o primeiro contrato no país para a preservação
de um território indígena em
troca de participação na venda
de créditos de carbono gerados
pela manutenção da floresta.
A negociação, com uma empresa brasileira, a C-Trade,
vem sendo tratada desde junho
do ano passado. Ela contraria a
posição defendida pelo Estado
brasileiro sobre o tema.
Segundo o governo federal, a
quantidade de mata preservada
no país é tão grande que os créditos gerados por sua simples
manutenção são capazes de
permitir a empresas que aumentem a poluição, e não o
contrário. A questão costuma
dividir ONGs ambientalistas
no país e no exterior.
Mas tanto os índios quanto a
Funai (Fundação Nacional do
Índio), assim como indigenistas da UFPA (Universidade Federal do Pará) e o Ministério
Público Federal, concordaram,
previamente, com os termos da
proposta apresentada. Ela ainda precisa ser oficialmente
chancelada pela etnia.
Segundo a oferta, 85% do dinheiro conseguido pela empresa ao vender no mercado os créditos de carbono irá para os
tembés. Os valores ainda não
foram fechados, mas os repasses à tribo devem ultrapassar
R$ 1 milhão por ano, ou cerca
de R$ 1.428 para cada uma das
700 famílias da reserva. Hoje, a
maior parte delas não tem nenhum tipo de renda.
Dos 279,8 mil hectares da reserva, 69 mil foram "ofertados"
para serem preservados. A intenção é, anualmente, fazer
uma análise periódica da área,
que determinará o quanto foi
desmatado e o que foi preservado, para então os valores serem
aumentados ou diminuídos.
Segundo Felício Pontes, procurador da República que atua
no caso, não há nenhum impedimento jurídico para que o negócio seja fechado, apesar da
posição do governo.
"Essa ideia pode ser uma solução para o problema de como
proteger áreas indígenas de todo o país." A Folha tentou falar
com a empresa C-Trade, mas
não conseguiu.
Hoje, o chamado mercado
"regular", atrelado ao Protocolo de Kyoto, ainda não aceita a
comercialização de créditos gerados pela preservação das florestas tropicais.
Em compensação, o mercado
"voluntário" -do qual participam empresas de países não
signatários do protocolo, por
exemplo-, aceita.
O impasse sobre aceitar ou
não créditos de carbono para
manter a floresta em pé, no
Brasil ou fora, deve ser debatido em dezembro, em Copenhague (Dinamarca), durante a
Conferência do Clima.
No caso do Pará, a maior discussão atualmente é como gerir os futuros recursos. A ideia
mais forte até agora, segundo
as pessoas envolvidas na negociação, é que parte do dinheiro
seja prioritariamente investida
em projetos já em andamento,
como produção de mel, e o resto seja distribuído igualmente
entre todas as famílias.
Distribuição de renda
O que Funai e indigenistas
temem é que o dinheiro seja administrado por poucos índios.
Se estes enriquecerem sozinhos, a maioria da comunidade
continuará miserável.
Para Juscelino Bessa, administrador da Funai em Belém
(PA), o contrato gera receio,
pois ainda não há experiência
ou regulamentação específica
sobre esse tipo de negócio.
"Mas tivemos que fazer isso,
pois estamos com a corda no
pescoço." Ele se refere à atual
situação da terra tembé Alto
Rio Guamá, no nordeste do Estado, invadida por posseiros,
grileiros e traficantes de droga,
para plantar maconha (leia texto abaixo, à esquerda).
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