São Paulo, segunda-feira, 03 de abril de 2000


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AMBIENTE
Para o Departamento de Estado, biomassa de florestas diminui efeito estufa e deveria gerar renda
EUA querem dar valor à Amazônia

Caio Guatelli/Folha Imagem
Brooks Yeager, do setor ambiental do Departamento de Estado dos EUA, na serra da Cantareira


MARCELO LEITE
Editor de Ciência

A baixa prioridade de temas ambientais na agenda pública brasileira ficou patente semana passada, com a passagem quase incógnita pelo país de um interlocutor poderoso, Brooks Yeager. Subsecretário-assistente para o Ambiente do Departamento de Estado, Yeager defende por exemplo que países que deixam suas florestas crescer deveriam ser pagos por isso.
No Brasil, essa discussão realiza-se apenas a porta fechadas. Embora possua a maior floresta tropical do mundo, também um dos maiores estoques de carbono do planeta, somente cientistas e burocratas discutem vantagens e desvantagens de pôr um preço no serviço prestado pela floresta.
O serviço, no caso, está relacionado com o efeito estufa (leia texto à direita). Derrubada ou queimada, a floresta emite carbono (CO2), contribuindo para o aquecimento global. Explorá-la racionalmente, deixando-a crescer onde for possível, ou fazer reflorestamento em áreas já degradadas, teria o efeito oposto.
No jargão do ambientalismo mundial, a absorção de CO2 é conhecida como "sequestro de carbono". Ao crescer e fazer fotossíntese, a vegetação absorve gás carbônico da atmosfera, fixando-o na forma de madeira.
"Na medida em que formos capazes de encontrar uma maneira de medir o valor sequestrado com o bom manejo florestal, de encontrar uma metodologia para ter bons pontos de partida quantitativos ("baselines') e ver os progressos feitos, acreditamos que eles devem ser creditáveis" disse Yeager à Folha. "Mas com a condição de ser rigoroso, não queremos incluir um monte de ar quente no sistema."
Uma forma que pode ser empregada para realizar esse crédito foi proposta pelo Brasil, nas negociações internacionais sobre mudança climática. É o chamado mecanismo de desenvolvimento limpo (MDL, ou CDM, na versão em inglês). Países em desenvolvimento que economizassem emissões poderiam "vendê-las" para países ricos, que precisam desse crédito para cumprir as metas de redução de CO2 assumidas no Protocolo de Kyoto.

Soberania restrita
Ironicamente, o governo brasileiro tem atuado contra a inclusão de florestas no MDL. Fala-se em "chantagem florestal", mas por trás parece haver relutância em ceder a plena soberania sobre áreas da floresta (na medida em que sua preservação teria de ser internacionalmente monitorada).
Yeager esteve em Brasília com o principal negociador brasileiro, Luiz Gylvan Meira Filho, da Agência Espacial Brasileira, mas disse que quase não tratou do tema. "Há espaço para várias opiniões a esse respeito. Há certamente questões com que temos de nos debater para tornar isso parte legítima do MDL e elas ainda não estão resolvidas."
Segundo o subsecretário-assistente, "há esperança de que alguns países considerem vantajoso aceitar metas" (de redução nas emissões, como fez a Argentina). "Encorajamos isso porque acreditamos também que é um mecanismo que traria transferências de capital para o mundo em desenvolvimento."
Os EUA, obviamente, têm interesse próprio na valoração de florestas. Depois de dizimá-las ao longo de seu desenvolvimento e abandonar as respectivas áreas, elas voltaram a crescer nas últimas décadas, sobretudo na parte leste do país. "Elas estão absorvendo carbono, e nós achamos que isso é parte da equação."


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