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MEDICINA
Método criado e patenteado por grupo da UFRJ flagra início da doença e permite tratamento precoce mais eficaz
Anticorpos radioativos detectam artrite
REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Pesquisadoras da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) desenvolveram e patentearam
um método capaz de detectar de
forma rápida e precoce a artrite
reumatóide, que afeta entre 3% e
5% da população mundial. Usando anticorpos radioativos, a técnica flagra o problema antes que ele
cause incapacitação e deformidade nas articulações do doente.
"Depois de usar o método em
mais de cem pacientes, não observamos efeitos colaterais", contou
à Folha a biomédica Flávia Paiva
Proença Martins, 25, que faz seu
doutorado no Departamento de
Radiologia da Faculdade de Medicina da UFRJ. Ao lado de sua
orientadora, a também biomédica Bianca Gutfilen, e da médica
nuclear Lea Mirian Barbosa Fonseca, Martins desenvolveu e testou a técnica, cuja patente já está
reservada no INPI (Instituto Nacional da Propriedade Industrial)
desde abril deste ano.
Martins explica que não existiam exames bioquímicos específicos que pudessem flagrar o mal
nos seus estágios iniciais. "A
doença só era diagnosticada
quando já estava causando a destruição das articulações", afirma.
Essa é a marca registrada da artrite reumatóide, uma doença que
os cientistas costumam apelidar
de auto-imune -ou seja, que surge pela ação descontrolada do sistema de defesa (imune) do organismo contra o próprio corpo.
No caso, os principais vilões são
os linfócitos T CD3 -células do
sistema imune que, em circunstâncias ainda pouco compreendidas, se aglomeram em volta do tecido cartilaginoso das articulações, causando inflamações que
podem destruí-lo. "Ainda não se
sabe bem por que isso acontece,
embora fatores genéticos pareçam estar envolvidos", afirma a
biomédica da UFRJ.
Direto no alvo
Um bom jeito de desmascarar a
ação da doença seria, portanto,
descobrir se as células renegadas
estavam em ação. O trio de pesquisadoras conseguiu isso com a
ajuda de um anticorpo conhecido
como OKT3. Essa molécula tem a
capacidade de reconhecer quimicamente os linfócitos T CD3 e
aderir às concentrações deles em
volta da articulação.
De nada adiantaria, no entanto,
lotar a corrente sanguínea do
doente com anticorpos se não fosse possível saber onde eles foram
parar. É por isso que o grupo
criou um método para "etiquetar" os anticorpos com o 99M, um
isótopo radioativo. A mistura é
injetada no paciente que se quer
examinar, num procedimento conhecido como cintilometria, comum em outros tipos de enfermidade. O elemento radioativo é eliminado naturalmente pela pessoa, depois do exame, sem danos
ao organismo.
Os raios gama emitidos pelos
anticorpos radioativos são flagrados por uma câmara especial (denominada, não por acaso, de gama-câmera). Num intervalo de
não mais que três horas, é possível
ter uma boa idéia das áreas afetadas (veja o quadro à esquerda).
Multiuso
Segundo Martins, o sistema
também pode ser usado para diferenciar artrite de artrose (outro
problema das articulações que,
diferentemente da primeira, costuma ser um desgaste por lesões
físicas, e não pelos linfócitos).
"Nesse caso, não há captação,
ou seja, os anticorpos não têm onde se fixar e não aparecem na imagem", explica a pesquisadora. Outra aplicação possível do sistema é
investigar os problemas de rejeição de órgãos transplantados, no
qual ocorre o mesmo problema
- a ação indesejada das células
de defesa.
Segundo Martins, o sistema poderia aumentar significativamente a qualidade de vida das pessoas
com artrite -um contingente
formado principalmente por mulheres dos 30 aos 50 anos, embora
haja também muitos pacientes do
sexo masculino. Existe ainda uma
versão da artrite reumatóide que
pode atacar crianças.
"A doença não tem cura, mas
você pode minimizar os sintomas
e evitar as deformidades com a
detecção precoce", avalia. "Isso é
importante porque, em geral, as
pessoas são obrigadas a parar de
trabalhar dez anos depois que a
doença é diagnosticada. E as
crianças podem ficar com uma
deformidade para a vida toda, caso não haja o tratamento precoce", relata Martins.
A intenção do grupo, agora, é
encontrar parceiros para que os
anticorpos radioativos possam
ser produzidos em escala industrial. "Com isso, seria bastante fácil de aplicar o método de diagnóstico em outros hospitais", avalia a biomédica da UFRJ.
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