|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FÍSICA
Jatos de raios gama do centro da galáxia sugerem que massa "oculta" venha de partículas leves
Grupo pode ter identificado matéria escura
MARCUS CHOWN
DA "NEW SCIENTIST"
A identidade da matéria escura
do Universo pode ter sido finalmente desvendada. No que parece ser o mais convincente candidato até agora, cientistas no Reino
Unido dizem que jatos de raios
gama vindos do centro da Via
Láctea revelam os sinais dessas
partículas fantasmagóricas.
Matéria escura é o apelido dado
a 7/8 da massa presente no Universo, mas que até hoje não pôde
ser identificada.
A pesquisa acaba de se tornar
pública (http://www.arxiv.org/
abs/astro-ph/0309686), e a equipe ainda aguarda a reação de especialistas em matéria escura.
Ainda que cautelosos, os autores
não escondem seu entusiasmo.
"Deixei tudo de lado para trabalhar nisso", afirma Dan Hooper,
da Universidade de Oxford (Reino Unido). "Estamos realmente
entusiasmados", afirma sua colega Céline Boehm.
A identidade da matéria escura
do Universo é o mistério mais notório da astronomia moderna. Os
cientistas acreditam que ela exista
porque sua gravidade afeta o modo como as galáxias se mantém
coesas. Mas suas partículas não
emitem radiação eletromagnética, portanto nunca foram detectadas diretamente. Ninguém sabe
como são as partículas, ou exatamente como estão distribuídas.
No entanto, dado que a matéria
escura "sente" a gravidade como
a matéria visível comum, é um
bom palpite prever que ela se acumule no centro da galáxia. Foi por
isso que Hooper, Boehm, Joseph
Silk e Michel Casse voltaram sua
atenção para um padrão diferenciado de raios gama proveniente
do miolo da Via Láctea.
É um sinal distinto, que tem
uma energia de 511 quiloelétron-volts (keV). Acredita-se que ele
seja produzido com a aniquilação
de elétrons e pósitrons (os equivalentes de elétrons na antimatéria;
partículas de matéria e de antimatéria se aniquilam mutuamente
quando entram em contato).
De onde vêm esses elétrons e
pósitrons? Especula-se sobre
muitas fontes, de uma estrela hipernova a uma de nêutrons ou
mesmo um buraco negro. "Mas
nenhuma dessas explicações parecia satisfatória", afirma Hooper.
Os pesquisadores se perguntaram então se os elétrons e pósitrons não poderiam estar vindo
da aniquilação de partículas e antipartículas de matéria escura no
centro da galáxia. Mas, para produzir uma linha definida de 511
keV -energia de dissipação de
um elétron-, os pósitrons e elétrons precisariam ser desacelerados até um repouso virtual, antes
de se aniquilarem uns aos outros.
Pesos leves
Isso excluiria a matéria escura
nas grandes massas que a maioria
dos especialistas espera. "Partículas de matéria escura pesadas produziriam elétrons de alta energia", diz Hooper. "Por ser difícil
imaginar como eles poderiam ser
desacelerados até um repouso,
formos forçados a postular uma
partícula surpreendentemente leve de matéria escura."
Por "leve" os pesquisadores entendem algo entre 1 e 100 megaelétron-volts, de mil a dez vezes
mais leve que um próton. Uma
partícula tão leve surpreende porque aceleradores de partículas as
criam rotineiramente. Assim, elas
já deveriam ter sido detectadas.
"Para ter escapado à detecção,
ela deve interagir muito fracamente", diz Hooper. "Uma partícula nessa faixa poderia ter passado despercebida", afirma Nigel
Smith, diretor do Experimento de
Colaboração sobre Matéria Escura, do Reino Unido.
Para testar a idéia, os pesquisadores se voltaram para as observações com o Integral, telescópio
de raios gama da Agência Espacial
Européia. Lançado em outubro
de 2002, o Integral fez as mais precisas medições já obtidas da linha
de 511 keV e mapeou as mudanças em seu brilho ao longo do núcleo central da galáxia. Numa revelação crucial, a equipe verificou
que o mapa de brilho concorda
exatamente com a distribuição
que seria de esperar de suas partículas leves de matéria escura.
Se a matéria escura for de fato
composta de tais partículas leves,
cada centímetro cúbico do espaço
nas vizinhanças da Terra conteria
algumas dezenas delas. Seria assim possível detectá-las com experimentos de laboratório.
"A proposta seria mais interessante se um experimento de física
nuclear ou de partículas detectasse uma partícula com as propriedades que o grupo sugere", diz
Ben Allanach, do Cern, o centro
europeu de física de partículas.
As equipes que caçam matéria
escura em geral focalizam partículas muito mais maciças, maiores do que 10 gigaelétron-volts,
tentando detectar a reação de um
núcleo atômico atingido por partícula de matéria escura. Silk e
seus colegas estão agora investigando se algum experimento já
realizado pode revelar evidências
da nova partícula, ou se algum deles pode ser facilmente modificado para detectá-la.
Texto Anterior: Medicina: Anticorpos radioativos detectam artrite Próximo Texto: Panorâmica - Astronomia: Titã teria mar de substâncias orgânicas Índice
|