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BIOTECNOLOGIA
Camundongos fabricam ômega-3, óleo que reduz colesterol; meta é obter leite, carne e ovos mais saudáveis
Roedor transgênico produz gordura "boa"
REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA
A paranóia moderna com o colesterol pode estar próxima do
fim graças a camundongos e vermes. Não que a idéia seja substituir a picanha por bifes repulsivos: roedores que receberam um
gene de verme foram capazes de
produzir a gordura "saudável"
ômega-3 em seu organismo,
abrindo a perspectiva de fazer o
mesmo com a carne, o leite e os
ovos consumidos todo dia.
Esse é o próximo passo do biólogo chinês Jing Kang e seus colegas da Escola Médica Harvard
(Costa Leste dos Estados Unidos).
De acordo com ele, não deve ser
um passo difícil: "Acho que iniciar a produção de ômega-3 em
ovos ou em leite é bastante possível e prático", afirma o pesquisador, autor principal do estudo que
está na revista científica "Nature"
(www.nature.com) de hoje.
Há tempos os pesquisadores sonham com um modo de intensificar a produção de ômega-3 (na
verdade um grupo de ácidos graxos, ou gorduras) nos animais
mais consumidos pela população
do Ocidente. As moléculas ingeridas são capazes de reduzir o colesterol no sangue humano e de prevenir o aparecimento de doenças
do coração, mas só são encontradas naturalmente em peixes, frutos do mar e óleo de canola.
Carne de vaca e de frango, ovos
e leite normalmente só contêm
ácidos graxos aparentados quimicamente, de nome ômega-6.
"Existem tentativas de suprir a
deficiência em ômega-3 desses
alimentos fornecendo aos animais ração à base de peixe, mas isso acaba se tornando muito caro",
explica Kang. "Por isso é que decidimos encontrar um jeito de tornar a quantidade de ômega-3
mais equilibrada nos alimentos
de origem animal".
O caminho escolhido pelos pesquisadores foi buscar um gene capaz de induzir a produção de
ômega-3 em mamíferos ou aves.
Seqüências de DNA que poderiam ser boas candidatas para isso
estão presentes em plantas e bactérias, explica Kang -e também
no verme nematódeo Caenorhabditis elegans, preferido de nove
entre dez cientistas que estudam o
desenvolvimento dos seres vivos.
Foi dele que eles retiraram o gene fat-1, que contém a receita para
a produção de uma enzima (substância que acelera reações químicas). No caso, a fat-1 permite que
o organismo transforme ômega-6
em ômega-3, adicionando ligações duplas de carbono à cadeia
da molécula de gordura.
Não bastava, entretanto, só inserir o gene nos embriões de camundongos. Os pesquisadores
precisaram juntar a ele uma seqüência de DNA que permitisse
seu funcionamento correto num
organismo de mamífero como o
dos camundongos, já que a maquinaria de leitura do código genético varia bastante entre espécies tão distantes de animal. Foi
preciso também usar trechos de
DNA que otimizassem a produção da enzima nos animais.
Apesar de todos os problemas
técnicos, o truque acabou dando
certo. Enquanto antes 98% dos
ácidos graxos do organismo dos
camundongos pertenciam ao
grupo ômega-6, os roedores
transgênicos passaram a produzir
ômega-3 em proporção quase
igual à de ômega-6, meio a meio, e
isso nos mais diversos tecidos, do
leite ao cérebro, passando pelo
coração e pelo sangue.
"Não seria desejável conseguirmos uma proporção muito maior
de ômega-3, já que o organismo
dos animais também necessita de
ômega-6, assim como o humano", pondera Kang.
Como ninguém costuma incluir
costeletas de camundongo na dieta, a meta dos pesquisadores é
realizar a transferência gênica em
galinhas e vacas. Para Kang, o
consumo de animais transgênicos
não apresentaria riscos à saúde.
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