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São Paulo, quinta-feira, 06 de fevereiro de 2003

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COLUMBIA

Segundo engenheiros da Nasa, vôo tornou-se acidentado o bastante para que astronautas sentissem as manobras

Tripulação pode ter notado problema minutos antes

JOHN NOBLE WILFORD
DO "THE NEW YORK TIMES"

Eles provavelmente sabiam que algo estava errado. Talvez só por alguns segundos, mas possivelmente por vários e longos minutos, eles quase com certeza sabiam que as coisas não aconteciam conforme o planejado.
Em sua última órbita, o Columbia estava 283 km acima da Terra, viajando a 28.000 km/h. Os astronautas estavam sentados. O comandante e o piloto ligaram jatos de manobra para virar a nave, de forma que ela voasse com sua cauda na frente, para frear.
Astronautas que voaram no ônibus espacial disseram que a ida para casa era geralmente cheia de suspense, mas calma e suave. A decida começa com um leve jato de dois pequenos foguetes.
Nada do que a Nasa revelou até agora indica que os astronautas suspeitassem da gravidade de sua situação. Mas, embora fossem os únicos com uma visão das janelas, o comandante e o piloto do Columbia quase certamente estavam olhando para a tela dos computadores durante a reentrada.
"Com base na nossa familiaridade com a equipe e o treinamento, sabemos que é isso o que eles faziam na descida", disse Ron Dittemore, gerente do programa de ônibus espaciais.

Sinal de perigo
A equipe estava atenta a qualquer sinal de anormalidade, e um deles ocorreu às 11h52 (horário de Brasília). Naquele momento, sensores mostraram um aumento anormal de temperatura perto do trem de pouso esquerdo. Até aquele momento, o vôo não parecia diferente de qualquer outra missão anterior, diz Frederick Hauck, um ex-astronauta que fez três vôos em ônibus espaciais.
A descida do Columbia começou às 11h15 sobre o oceano Índico, conforme os quatro computadores de vôo ordenavam automaticamente que os motores do sistema de manobra orbital se ligassem por 2 minutos e 38 segundos, diminuindo a velocidade.
"Dá para sentir aquele leve tranco", lembra Hauck. Depois disso, o comandante e o piloto verificaram os dados para se certificar de que o computador estava mantendo o ritmo correto de descida.
Conforme o planejado, jatos de manobra viraram a nave para a configuração de descida, ou "ângulo de ataque". O nariz foi apontado para cima num ângulo de 40, expondo a parte de baixo da fuselagem e das asas ao impacto do calor causado pelo atrito com a atmosfera. Essa área da nave é protegida por espessas pastilhas de cerâmica resistentes ao calor.
O ângulo de ataque é crítico para a reentrada. Se for maior que 40, o ônibus espacial poderia ser empurrado para trás. Suas superfícies mais vulneráveis estariam expostas a um aumento catastrófico de calor. Se o ângulo de aproximação é mais fechado, a nave entraria rápido demais na atmosfera. O superaquecimento também seria desastroso.
Às 11h45, meia hora antes do pouso previsto, o ônibus espacial entrou na atmosfera, a 120 km de altura. A nave fez a transição de ônibus espacial para planador. Os jatos foram desligados, e os computadores instruíram os flaps das asas a manter um curso firme.
O Columbia estava indo rápido demais. Às 11h49, ele fez a primeira das três amplas curvas em forma de S que estavam planejadas, primeiro à direita, depois à esquerda. Essas manobras ampliam a permanência do ônibus espacial na atmosfera, durante a qual pode ser desacelerado pelo atrito.
Hauck rememora os primeiros minutos de volta na atmosfera. De repente, diz, começa a sensação de braços pesados, com a gravidade. Após dias "sem peso", os astronautas têm de se esforçar para erguer os braços. O computador ainda está fazendo as manobras, e isso deveria continuar até três minutos antes da descida, quando os astronautas finalmente passam para controle manual.
Se algo tiver dado errado, diz Rob Navias, porta-voz do Centro Espacial Johnson, os astronautas poderiam ter dado comandos aos computadores. Isso não chegou a ser feito. Para Hauck, isso provavelmente não seria feito, a não ser em circunstâncias extremas, porque computadores podem reagir mais rápido do que pessoas.

Calor excessivo
A reentrada se desencaminhou às 11h52, como descreveu Dittemore. Nos três minutos seguintes, sobre a Califórnia, as temperaturas dispararam no quarto e no quinto circuitos de frenagem. Às 11h57, sobre o Arizona e o Novo México, as temperaturas na superfície da asa esquerda já estavam fora da escala.
Algo parecia seriamente errado, mas os problemas ocorriam tão rapidamente que nem o controle da missão nem os astronautas pareciam reconhecer o perigo, até que fosse tarde demais.
Às 11h59, sobre o oeste do Texas, a asa esquerda estava com problemas. Algo -uma pastilha áspera ou ausente, ou algo insuspeitado- estava causando uma força de arrasto na asa. Os computadores de vôo responderam mandando a nave virar e inclinar-se. Era um esforço desesperado para manter o curso, talvez estressante demais para a velha nave.
Hauck diz que a tripulação "teria visto flutuações nos controles de vôo" nos computadores.
No domingo, Dittemore parecia pensar que os astronautas não tinham sentido as manobras corretivas. Com mais informação, porém, na segunda-feira ele disse que a nave estava corcoveando mais do que tinham pensado.
"O que está se tornando de interesse para nós é a taxa de mudança", diz. "As superfícies aerodinâmicas estavam fazendo o que precisavam para contrabalançar o arrasto no lado esquerdo do veículo. Os jatos da direita tiveram de entrar em ação para ajudar."
Parece que o controle do sistema estava "perdendo terreno" nos esforços para estabilizar o Columbia, diz. O trajeto estava ficando mais e mais acidentado. "Não foi muito depois desse ponto que perdemos todos os dados e a comunicação com a tripulação."


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