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LEI DE BIOSSEGURANÇA
Projeto estava ameaçado por bancada evangélica, caso não proibisse uso de célula embrionária
Lobby religioso veta pesquisa com embrião
DA SUCURSAL DE BRASÍLIA
DA REPORTAGEM LOCAL
Além da articulação dos ambientalistas para modificar a Lei
de Biossegurança, o deputado Renildo Calheiros (PC do B-PE), relator do projeto na Câmara, enfrentou pressão de evangélicos
para modificar o texto que foi a
plenário na madrugada de ontem.
A bancada evangélica na Casa
-55 deputados- ameaçou votar contra o projeto caso não fosse
vetada a manipulação de embriões humanos para fim de clonagem terapêutica, conforme
previa o relatório anterior, de autoria do ex-líder do governo Aldo
Rebelo (PC do B-SP).
Células-tronco têm o poder de
se transformar em células especializadas do corpo e por isso são
usadas em pesquisas com o objetivo de reconstituir órgãos e tecidos danificados. Pelo novo texto,
só poderão ser obtidas de cordões
umbilicais, medula óssea e sangue. O veto à alteração de código
genético humano permanece.
Na mesa de negociações, os
evangélicos ganharam o apoio
dos católicos, ampliando o quórum para cerca de 120 deputados.
A CNBB (Conferência Nacional
dos Bispos do Brasil) enviou representantes ao Congresso. Diante da ameaça de revés em plenário, veio a concessão de Calheiros.
Questão do aborto
Os evangélicos argumentavam
que a permissão para manipulação de embriões humanos "descriminalizaria o aborto". "Nós entendemos que a vida começa na
concepção. Cada um de nós um
dia já foi embrião. Creio que foi
uma vitória da vida", disse o líder
da Frente Evangélica na Casa,
Adelor Vieira (PMDB-SC), que
conduziu as negociações ao lado
do deputado petista Henrique
Afonso (AC).
Segundo Vieira, os evangélicos
"estavam preparados para medidas extremas", caso não houvesse
mudanças no texto. Apresentariam dois DVS (destaque para votação em separado) para suprimir
o artigo relacionado ao tema.
O líder dos evangélicos disse
ainda "não acreditar que haja alguém disposto a mudar esse ponto do projeto no Senado", onde a
frente tem três congressistas.
Pesquisadores da área não gostaram da decisão. Para Lygia da
Veiga Pereira, do Centro de Estudos do Genoma Humano da USP,
a proibição do uso de células extraídas de embriões para pesquisa
estabelecida pelo projeto aprovado na Câmara representa um sério entrave. "Mesmo nos EUA, o
que você tem é uma proibição para o uso de verbas federais na produção de células-tronco, mas não
um veto total à pesquisa", disse.
"O que a gente está fazendo aqui é
uma limitação muito grande."
Para ela, o dano resultará em
dependência de esforços realizados por cientistas no exterior. "O
que eu teria de fazer? Poderia
comprar essas células nos EUA,
vou ter de encontrar isso lá fora. E
ainda perco a chance de treinar
aqui pessoas que pudessem desenvolver essas linhagens. É um
marco de limitação do progresso
da ciência no país. A proibição, eu
acho, é um atraso."
Contexto internacional
Ela aponta que há outros países
ainda mais permissivos que os Estados Unidos, que não autorizam
o uso de verbas federais nesse tipo
de pesquisa, mas não vetam expressamente os estudos. "Além
do Reino Unido, em Israel eles são
bem liberais e na China também",
diz Pereira. Canadá e Austrália
também liberaram as pesquisas.
A União Européia ainda está debatendo a possibilidade de unificar as regras para uso de células
de embriões em pesquisa.
Independentemente da posição
final adotada na legislação brasileira, a bióloga também aponta a
necessidade de esclarecer alguns
pontos confusos, que indicam
possíveis exceções à proibição no
caso de "clonagem terapêutica
com células pluripotentes".
"Clonagem terapêutica, na definição científica, pressupõe gerar
um embrião a partir de transferência nuclear. Então, o que eles
estão chamando de "clonagem terapêutica'? E mais, o que eles chamam de "embrião'? Qual a definição de "embrião'? Isso não está definido no projeto de lei." Ela pergunta: "Será que isso foi escrito de
forma consciente? Ou é fruto de
uma ignorância?"
Os mesmos problemas são
apontados por Mayana Zatz, também da USP. "Pelos poucos depoimentos que eu ouvi, as pessoas
que votaram não estão informadas. Só se fala de Parkinson e Alzheimer, mas não se fala das
doenças degenerativas que matam crianças e jovens", diz.
"E parece que há uma grande
confusão de conceitos, entre clonagem terapêutica, terapia celular, células-tronco etc."
A pesquisadora se propõe a ir a
Brasília para ajudar no processo.
"Eu iria com o maior prazer, explicar numa linguagem que todos
os deputados possam entender."
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