São Paulo, terça-feira, 06 de novembro de 2001

Próximo Texto | Índice

PSIQUIATRIA

Inalação de gás carbônico pode desencadear ataques e identificar vítimas do transtorno, dizem cientistas do Rio

Brasileiros criam diagnóstico para pânico

LUISA MASSARANI
FREE-LANCE PARA A FOLHA

O gás carbônico (CO2) expelido durante a respiração pode ser uma ferramenta para o diagnóstico e o tratamento do transtorno do pânico, mal que atinge cerca de 3% da população mundial. É o que estão demonstrando pesquisadores dos institutos de Psiquiatria e de Biofísica Carlos Chagas Filho, ambos da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
O transtorno do pânico envolve crises de ansiedade sem motivo aparente, que incluem taquicardia e falta de ar. Os sintomas são seguidos da sensação de estar enlouquecendo, perdendo o controle sobre o corpo ou morrendo. Com o tempo, a pessoa desenvolve hipocondria e fobias (medos excessivos não-justificados).
O estudo conduzido na UFRJ inclui um exame de fácil e rápida aplicação. O paciente inspira, por poucos segundos, uma mistura gasosa com CO2 e O2 (oxigênio), sob acompanhamento médico.
"O teste não provoca alterações em indivíduos que não têm o transtorno do pânico, mas os pacientes que apresentam o mal se referem a sintomas parecidos àqueles vivenciados durante o ataque de pânico", explica Walter Zin, diretor do Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho.
"As inalações com a mistura de CO2 permitem diferenciar claramente indivíduos com transtorno de pânico daqueles que não o têm", afirma Antonio Egidio Nardi, do Instituto de Psiquiatria, outro responsável pelo estudo.
A eficácia do teste fica entre 80% e 90%. Atualmente, o diagnóstico do transtorno é feito na clínica apenas por meio de exames psiquiátricos, com base nos sintomas. O teste da UFRJ pode ser mais um instrumento para garantir a detecção precisa do mal.
"O exame com mistura de CO2 ganhou uma aceitação maior, em detrimento de outros testes existentes para provocar pânico em laboratório, porque é não-invasivo e simples. Os outros, em geral, pressupõem a injeção de substâncias nas veias que podem ter efeitos colaterais", diz Nardi.
Os pesquisadores estão mostrando que o teste de CO2 é útil também para medir a resposta terapêutica durante o tratamento do transtorno. Os pacientes que aceitaram participar do estudo são submetidos ao exame antes e depois de iniciar a ingestão de medicamentos. Isso permite verificar se as drogas prescritas e suas dosagens estão sendo adequadas e fazendo o efeito desejado.
O exame de CO2, por enquanto, só pode ser feito na UFRJ. Pessoas que sejam portadoras do mal podem participar do estudo, de acordo com alguns critérios de aceitação, entre eles: ter entre 18 e 55 anos, não estar ingerindo de antemão quaisquer medicamentos, não ser fumante nem portador de doenças respiratórias ou cardiovasculares.
Como outras doenças mentais, ainda não se conhecem, de maneira clara, as causas do transtorno do pânico. Acredita-se que haja um fator hereditário. De fato, sobem de 3% para 25% as chances de uma pessoa apresentar o mal quando tem familiares próximos com a doença.
Sabe-se também que há uma associação entre o transtorno do pânico e a respiração. Os pesquisadores da UFRJ estão se dedicando a entender melhor essa relação: "O estudo mais direcionado do controle da ventilação [respiração" poderá fornecer subsídios importantes para a compreensão da gênese dos ataques de pânico", afirma Zin.

Grécia Antiga
O transtorno do pânico não é uma doença característica só da modernidade. Diz a etimologia que o nome "pânico" vem de Pã, deus grego muito feio e brincalhão. Uma de suas brincadeiras era dar sustos nos viajantes que circulavam pelas estradas da Grécia. Um dos locais mais prováveis para o deus pregar suas peças era em frente ao seu templo, onde ficava a praça do mercado.
Para não tomar um susto, as pessoas tentavam ao máximo evitar a ida às compras. Como a praça do mercado é chamada em grego de "ágora", a situação ficou conhecida como "agorafobia".


Próximo Texto: Virologia: Mutação faz HIV enganar remédio
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.