|
Próximo Texto | Índice
CLIMA
Queima do combustível produz grande quantidade de fuligem, que retém mais calor na atmosfera que o gás carbônico
Estudo culpa diesel por aquecimento global
SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
Um estudo publicado nos EUA
mostra que a substituição de gasolina por diesel para reduzir as
emissões de gás carbônico na atmosfera não desaceleram o processo de aquecimento global. Ao
contrário, o intensificam. Pelo
visto, até quando o assunto é o
que acontece no céu, o inferno está cheio de boas intenções.
A pesquisa, publicada na edição
de outubro do "Journal of
Geophysical Research" (www.agu.org), aponta que a fuligem
preta emitida pela queima do diesel esquenta muito mais a atmosfera do que o gás carbônico, que é
emitido em maior quantidade pela gasolina. Quando se leva em
conta só a emissão de CO2, o óleo
diesel parece ser uma opção menos agressiva ao equilíbrio térmico da Terra. É o que muitos governos já estão fazendo, com legislações que favorecem a substituição
da gasolina por esse combustível.
"Na Europa, há impostos que
favorecem o diesel", afirma o engenheiro ambiental Mark Jacobson, da Universidade de Stanford,
autor do novo estudo. "Os europeus estão pensando em cumprir
parte de suas metas de redução de
emissão de dióxido de carbono
no Protocolo de Kyoto com estímulos ao diesel. Eu não acho que
essa seja uma boa idéia."
Jacobson fez um estudo detalhado da atuação das partículas de
fuligem, as mesmas que o diesel
emite após sua combustão, o que
resultou na identificação de 12 diferentes efeitos atmosféricos.
"Trabalho nesse modelo desde
1989, já faz 13 anos", conta.
Pior que o CO2
Ao realizar uma simulação por
computador com todos esses efeitos em conta, ele descobriu que a
fuligem do diesel supera em muito os benefícios da menor emissão de CO2. Segundo seus cálculos, cortando toda a emissão de
fuligem na atmosfera, seria possível reduzir em 20% a 45% o processo de aquecimento global.
O mesmo efeito poderia ser obtido cortando um terço das emissões de CO2, mas ele só seria plenamente sentido em 50 a 200
anos. Já o corte de fuligem seria
sentido bem antes -3 a 5 anos.
Esse diferencial de tempo ocorre porque o tempo que as partículas ficam suspensas na atmosfera
é muito menor do que o que os
gases levam para sair.
"Conheço bem esse estudo, e o
Mark Jacobson de Stanford está
publicando uma série de artigos
sobre essa questão", diz Paulo Artaxo, físico da USP e membro do
IPCC (Painel Intergovernamental
sobre Mudança Climática). "O
efeito dos aerossóis [partículas]
no sistema climático global foi subestimado até algum tempo atrás.
Mas, nos últimos meses, vários
estudos estão apontando que os
aerossóis são tão ou mais importantes que o efeito dos gases-estufa para o aquecimento global."
Embora aponte a importância
da fuligem (particulados de carbono) como componente do
aquecimento global, Jacobson reconhece que o gás carbônico continua sendo a chave para a solução do problema. "Não importa o
que façamos, precisaremos cortar
gás carbônico também", diz.
Não é à toa que o pesquisador ficou insatisfeito quando George
W. Bush requisitou um rascunho
de seu estudo e usou suas conclusões para justificar o abandono do
Protocolo de Kyoto, apontando
que o acordo internacional, entre
outras coisas, não tocava na questão da emissão de fuligem.
"O governo estava preparando
sua política de combate ao aquecimento global. Eles ficaram sabendo do meu estudo, pediram
uma cópia e eu enviei a eles", conta. Quando viu que Bush usou
suas conclusões para simplesmente descartar o protocolo, Jacobson escreveu em seu site
(www.stanford.edu/group/efmh/jacobson/) que não aprovava a decisão do presidente.
"Por um lado, fiquei feliz por ele
ter reconhecido que o aquecimento global era um problema
importante e a fuligem, um componente significativo dele", diz.
"Por outro, não acho que isso era
motivo para abandonar o protocolo, que é um passo importante
para atacar a principal origem do
problema, que é o CO2."
Próximo Texto: Biotecnologia: DNA vira personagem de comédia Índice
|