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PERISCÓPIO
Críticas aos testes de compostos cancerígenos em ratos
JOSÉ REIS
especial para a Folha
Na revista "Science", P.H.
Abelson escreveu oportuno editorial criticando os testes feitos
em ratos e camundongos para
determinar a possível ação cancerígena (produtora de câncer)
de substâncias. Segundo ele, os
resultados desses testes costumam gerar medidas muito rígidas e assustadora publicidade
que acabam criando no público
ansiedade e quimiofobia.
O método principal para estabelecer a carcinogenicidade potencial baseia-se na ministração
diária de enormes doses de substâncias químicas a roedores endogâmicos (consanguíneos) durante toda a vida. A seguir, por
meio de duvidosos modelos que
abrangem grandes fatores de segurança, os resultados são extrapolados para efeitos de mínimas
doses em seres humanos. Se esses processos continuarem em
vigor para fixar níveis reguladores, diz ele, o custo de dissipar
riscos fantasmas ficará em centenas de bilhões de dólares com
mínimo benefício para a saúde
pública, ao mesmo tempo em
que os verdadeiros riscos deixam
de merecer a atenção adequada.
É crescente o número de críticos dos processos atualmente em
uso, liderados por Bruce Adams
e colaboradores, que têm publicado importantes trabalhos de
informação documentados por
extensas bibliografias. Na verdade, é restrito o número de agentes químicos, naturais e sintéticos, que reagem com o DNA a
ponto de provocar mutação. A
maioria das substâncias químicas não é mutagênica, mas,
quando se administra a máxima
dose tolerada (MTD) diariamente a roedores durante a vida, cerca de metade delas produz câncer em excesso, geralmente no
fim da vida dos animais. Experimentos nos quais produtos sintéticos industriais foram ministrados na MTD apontaram como
carcinogênicos 212 de 350 produtos testados. Experimentos semelhantes com substâncias naturalmente presentes nos alimentos indicaram 27 carcinogênicos num total de 52, sendo os
produtos assim classificados encontrados em vegetais diferentes, como maçãs, cenouras, aipo,
café, alface, repolho, suco de laranja, ervilha, batata, tomate. É
curioso notar que eles ocorrem
em quantidades milhares de vezes superiores às dos produtos
sintéticos.
Como defesa contra predadores e parasitas, as plantas desenvolvem numerosas substâncias
que exercem efeitos patogênicos
em seus atacantes e consumidores. Ames e Gold calculam que os
alimentos vegetais contêm de
5.000 a 10 mil pesticidas naturais.
Uma planta típica encerra um total de 1% ou mais dessas substâncias. Ingerimos 10 mil vezes mais
pesticidas de origem vegetal do
que sintéticos.
Cabe todavia lembrar, assinala
Abelson, que virtualmente quase
todas as substâncias químicas
são tóxicas se ingeridas em dose
excessiva: nessas condições, até o
sal comum pode causar câncer
gástrico. Ames e Gold salientam
que teores elevados de substâncias químicas causam morte celular em larga escala e substituição por divisão, estado em que as
células são mais sujeitas a mutações do que quando quiescentes.
Todo agente que cause divisão
crônica pode ser indiretamente
mutagênico, porque aumenta a
probabilidade de converter em
mutações os danos endógenos ao
DNA. Mas, quando ministradas
em doses menores que a MTD,
essas substâncias não tendem a
provocar alta proporção de divisão celular e, por isso, não aumentariam o número de mutações. Assim, uma substância que
produz morte celular e câncer no
limite MTD poderia ser inócua
em doses menores.
Finaliza Abelson afirmando
que frutas e verduras tendem a
reduzir a incidência do câncer
humano. É por isso enganoso o
teste da MTD que aponta como
carcinogênicas para o homem as
substâncias químicas das plantas. O mesmo raciocínio aplica-se aos produtos sintéticos.
"Os testes padrões de carcinogenicidade que usam roedores são
relíquias obsoletas da ignorância
de décadas passadas." Os enormes aperfeiçoamentos dos procedimentos analíticos e outros
possibilitam uma nova toxicologia com avaliação muito mais
realista dos teores que ocasionam efeitos deletérios. É a conclusão categórica do editorialista.
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