São Paulo, segunda-feira, 08 de março de 2004

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NEUROCIÊNCIA

Mariposa serve de modelo para estudar transmissores de infecções

Faro de inseto dá pista sobre doenças

RICARDO BONALUME NETO
ENVIADO ESPECIAL A NATAL

O estudo de uma mariposa gigante está dando dicas importantes aos cientistas sobre como evitar a transmissão de doenças por insetos sugadores de sangue. A mariposa conhecida pelo nome científico Manduca sexta é o modelo ideal para entender como insetos chegam a suas vítimas guiados pelo cheiro.
"Se você quiser ter um impacto na área de saúde humana, estude o nariz de mosquitos", resume o pesquisador norte-americano John Hildebrand, da Universidade do Arizona.
Hildebrand fez uma palestra sobre o tema durante o 1º Simpósio de Neurociências de Natal, que terminou ontem. O encontro marca o início da instalação do Instituto Internacional de Neurociência de Natal, uma iniciativa do neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, que trabalha na Universidade Duke, da Carolina do Norte (Estados Unidos).
Hildebrand fez a única apresentação sobre um tema bem específico: o sistema nervoso de insetos, notadamente a maneira como percebem odores no ambiente. Essa percepção é fundamental para os insetos se reproduzirem e se alimentarem -seja de sangue, como no caso dos mosquitos que transmitem doenças como dengue ou malária, seja néctar de flores, como no caso da mariposa Manduca sexta.
Entender como os insetos utilizam os odores dispersos pelo ambiente também pode ter impacto na produção de alimentos. "Entre 30% e 35% das plantações de alimentos são destruídas por pragas", diz Hildebrand.
Mariposas colocam seus ovos em plantas selecionadas, como o tomateiro. Para distinguir uma planta da outra, as mariposas usam apenas dicas olfativas. Do mesmo modo, o mosquito vetor de doença tropical também usa o odor para picar o homem, e não outro animal, explica o cientista.
Em uma apresentação anterior, três destacados pesquisadores brasileiros na área de medicina tropical -Hildebrando Pereira da Silva e o casal Ruth e Victor Nussenzveig- haviam sugerido maior investimento nessa área, pois doenças parasitárias afetam milhões de brasileiros.
Havia sido sugerida até a criação de um instituto de medicina tropical vinculado ao novo instituto de neurociência. Hildebrand declarou que o estudo do sistema nervoso e do comportamento de insetos poderia ser justamente a ponte ligando os dois institutos.
A mariposa Manduca sexta, do tamanho de um pássaro pequeno, é fácil de estudar e serve como modelo para estudos com mosquitos ou outros vetores de doença, assim como camundongos ou ratos servem para estudar o ser humano, diz o pesquisador da Universidade do Arizona.
Hildebrand mostrou como diversos odores estimulam áreas determinadas do sistema nervoso da mariposa. Machos e fêmeas têm estruturas distintas para a percepção de feromônios, substâncias ligadas à atração sexual.
O "perfume" que a fêmea solta no ar para atrair o macho tem dois componentes principais, cada um analisado por um pedaço diverso da estrutura olfativa. Utilizando microssondas de silício, Hildebrand e colegas conseguem gravar o "disparo" das células nervosas (neurônios).
A microssonda é como um garfo de três pontas, cada uma gravando em quatro pontos de um glomérulo, a estrutura olfativa. O registro dos pulsos elétricos -são dois por segundo- permite construir um padrão de atividade dos neurônios, que varia para cada tipo de cheiro.
Plantas, insetos e outros animais vivem uma guerra química constante para se alimentar, reproduzir e deixar descendentes viáveis. O entendimento desses mecanismos naturais permite achar novas estratégias para combater tanto a perda de culturas agrícolas como a infecção pelos insetos sugadores de sangue.



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