São Paulo, segunda-feira, 08 de julho de 2002

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MEDICINA

Excesso de substância produzida pelo tumor ajuda a detectar doença e sua gravidade com alto grau de segurança

Teste de urina identifica câncer na bexiga

REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Uma pesquisa realizada na Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) criou uma forma simples e não-invasiva de identificar o câncer na bexiga. A técnica usa o ácido hialurônico, uma substância produzida pelo tumor e carregada pela urina, para apontar a existência do câncer e a provável gravidade da doença.
Além de substituir com grau similar de precisão o incômodo de endoscopia e biópsia, no qual um aparelho precisa ser inserido no canal urinário do paciente e se retira uma amostra de tecido, a técnica também é bastante segura: quando o resultado do teste é negativo, há uma probabilidade de 96% de que não haja a doença.
O médico Luiz Eduardo Café, 34, que desenvolveu o teste numa tese de doutorado defendida recentemente na Unifesp, explica que o ácido hialurônico é um velho conhecido da ciência, nem sempre associado ao câncer. "Ele está presente normalmente no organismo, integrando a matriz extracelular [o espaço que existe entre as células]", afirma.
O problema é quando a substância se manifesta em excesso: isso indica a multiplicação descontrolada e desordenada das células que é a marca registrada do câncer. Por conta dessa bagunça fisiológica, a própria matriz extra-celular aumenta, o mesmo ocorrendo com a quantidade do ácido.
"Isso já permitia que ele fosse usado para detectar a presença do câncer, mas apenas quando eram retiradas amostras do tecido", conta Café. Mas, no caso específico do câncer de bexiga, a coisa poderia ser bem mais simples.
"O tecido que eventualmente poderia conter o tumor é lavado pela urina", explica Café. Passando pelas células tumorais, o líquido arrasta consigo o ácido hialurônico em excesso, que é comodamente recolhido numa simples ida ao banheiro do paciente.

Grupo de risco
Foi com base nessa percepção que o trabalho de Café começou, em 1998. Foram selecionados 52 pacientes do sexo masculino, com mais de 40 anos de idade e com traços de sangue na urina -um possível grupo de risco para esse tipo de câncer.
Embora não tenham conseguido escapar do doloroso exame endoscópico, esses pacientes (28 dos quais acabaram mesmo tendo câncer) deram aos médicos a correlação entre o nível do ácido hialurônico e a presença da doença, atestado pelo exame tradicional do tecido. Se a substância aparecia em quantidade inferior a cinco nanogramas (cada nanograma equivale a um bilionésimo de grama) por mililitro de urina, era quase certo que não havia câncer.
Cerca de 70% das amostras em que o valor era superior a esse indicavam a presença do tumor. Com valores muito alterados (mais de 30 nanogramas), o tumor não só estava presente como era muito grave, tendo atingido o músculo da bexiga.
"Isso é uma vantagem não só pelo valor prognóstico do método, mas também para verificar a progressão da doença, porque o câncer de bexiga reaparece em até 75% dos casos", afirma Café. Dessa forma, o teste urinário poderia indicar não só o reaparecimento da doença, mas também se ela voltou com gravidade redobrada.
De acordo com Café, os resultados devem ser confirmados e ampliados num grupo de mais 300 pacientes. Não há estatísticas seguras sobre o câncer da bexiga no Brasil. Contudo, nos Estados Unidos, ele é o quarto câncer mais comum entre os homens.


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