São Paulo, sexta-feira, 09 de agosto de 2002

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AMBIENTE

Pesquisa afirma que sai cem vezes mais caro destruir ecossistemas do que conservá-los; economistas já discordam

Preservação pode ser excelente negócio

CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA

Um estudo publicado hoje deve reabrir um debate feroz entre economistas e ambientalistas. Ele diz que os benefícios econômicos da preservação dos ambientes selvagens são até cem vezes maiores que os de sua conversão em lavoura ou pasto, por exemplo.
A tese, apresentada por pesquisadores dos EUA e do Reino Unido na revista americana "Science" (www.sciencemag.org), vai contra fundamentos básicos da economia: afinal, a destruição dos habitats ocorre justamente porque isso dá dinheiro. Mas a longo prazo, afirmam os cientistas, ela pode ser um mau negócio.
O novo estudo é a continuação de um trabalho tão famoso quanto polêmico. Em 1997, um grupo de pesquisadores liderado por Robert Costanza, da Universidade de Maryland (EUA), calculou o valor potencial de toda a biosfera.
Com base em vários estudos de caso, eles estimaram quanto valeria um hectare de um bioma intacto com base em quanto as pessoas se disporiam a pagar pelos bens e serviços fornecidos por ele.
O resultado foi de calar a boca de qualquer madeireiro clandestino: os ecossistemas do globo valeriam de US$ 16 trilhões a US$ 54 trilhões. Na média, isso é quase o dobro da riqueza produzida no mundo por ano. "Veja bem: foi uma estimativa conservadora, porque não havia dados suficientes para outros biomas", afirma Costanza, que também assina o novo estudo, coordenado por Andrew Balmford, da Universidade de Cambridge (Reino Unido).
O grupo de Balmford analisou 300 estudos de caso à procura de estimativas que medissem os benefícios econômicos de um bioma intacto em comparação com uma área do mesmo bioma convertida para usos comuns.
Dois dos estudos focalizaram florestas tropicais. Num deles, em Camarões, foi comparado o valor total de uma floresta explorada por extração madeireira de baixo impacto com outros usos, como agropecuária em pequena escala e monoculturas de borracha.
O valor total da floresta manejada, considerando serviços ambientais -fornecimento de água, manutenção de estoques de carbono e de espécies ameaçadas-, foi 18% maior que o da mesma terra convertida à agricultura.
Quando o bioma analisado era um manguezal, a disparidade ficava ainda maior: um estudo de caso na Tailândia comparando criação de camarões e preservação mostrava que, somados os benefícios ambientais, o ecossistema intacto valia 73% a mais que o seu equivalente alterado.
Em seguida, os pesquisadores calcularam a perda líquida anual decorrente da conversão dos biomas: US$ 250 bilhões.
Para evitar essa perda, o estudo propõe a criação de uma rede de reservas que englobaria 15% das terras do planeta, principalmente em ecossistemas ameaçados e ricos em biodiversidade, como florestas tropicais. O custo de uma rede dessas seria de US$ 45 bilhões por ano -cem vezes menos que o valor dos bens e serviços prestados pelo megaparque.
As primeiras pedradas no estudo partiram dos próprios economistas ambientais. Para Carlos Eduardo Young, da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), o estudo é "literatura muito interessante, mas sem rigor metodológico nenhum". Costanza concorda que a conta vale mais como exercício do que como proposta ao mercado. "O que estamos tentando documentar é o valor do bem-estar proporcionado pelos ecossistemas", diz.



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