São Paulo, Quinta-feira, 09 de Setembro de 1999
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CIÊNCIA
Semente é um elo frágil da diversidade na Amazônia

MARCELO LEITE
especial para a Folha

Conservar grandes áreas da floresta amazônica, ou pelo menos várias áreas menores, parece medida de bom senso para preservar sua biodiversidade. Como bom senso é coisa rara, chega em boa hora uma pesquisa genética mostrando como a dispersão de sementes de árvores vai na contramão desse esforço.
Nas plantas, os gametas (células reprodutivas) masculinos estão no pólen. Encerrados em partículas leves e diminutas, os genes do lado paterno são carregados por insetos ou pelo vento até outra árvore, onde ocorre a fecundação de gametas femininos (óvulos).
Com a falta de mobilidade dos óvulos, genes da linhagem materna têm pernas curtas. Eles só se dispersam pelo ambiente com ajuda de sementes. Dependem de pássaros e mamíferos que as carreguem ou enterrem, em geral não muito longe da planta-mãe.
Não é preciso muita pesquisa para perceber a defasagem de mobilidade entre pólen e sementes. Já medir a diferença não é tão simples. Há muitos estudos sobre dispersão de pólen na Amazônia, mas poucos sobre o fluxo de genes de linhagem materna.
Foi esse o desafio a que se dedicou Matthew Hamilton, 31, da Universidade Georgetown, EUA. Para medir o grau de parentesco matrilinear entre árvores da espécie Corythophora alta, o geneticista escolheu o DNA de um corpúsculo fora do núcleo das células vegetais, o cloroplasto (onde há a clorofila usada na fotossíntese).
Como explica Hamilton em seu artigo na revista "Nature" de hoje, os genes dessas organelas passam de planta para planta com as sementes, nunca pelo pólen. Árvores com o mesmo perfil de DNA do cloroplasto (cpDNA), portanto, encontram-se na mesma área de dispersão de sementes.
O que Hamilton descobriu ao examinar 162 árvores da espécie (conhecida como ripeiro vermelho ou castanha-jacaré) perto de Manaus foi que o alcance das sementes é muito pequeno. Dentro dessa área de dispersão, todas as árvores são meias irmãs (por parte de mãe). Fora do quintal materno, a tendência é encontrar apenas primas muito distantes.
"Meus resultados sugerem que fragmentos florestais pequenos, comuns na Amazônia oriental, podem não encerrar (toda) a variação genética disponível, a menos que muitas dessas pequenas parcelas sejam preservadas", disse Hamilton à Folha.
Um mínimo de diversidade genética é fundamental para a sobrevivência de uma espécie. Quando cai abaixo de certo limiar, começa a erosão do repertório de truques que pode usar contra inimigos naturais ou para adaptar-se ao ambiente em transformação.


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