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QUÍMICA
Dupla ajudou a explicar fluxo de água e átomos carregados em tecidos vivos, esclarecendo certos casos de diabetes
Canais das células dão Nobel a americanos
REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Os dois mais jovens vencedores
do Prêmio Nobel deste ano, até
agora, ajudaram a resolver um velho problema da bioquímica: como a célula regula a entrada e a
saída de substâncias através de
sua membrana. Ao esclarecer a
estrutura e funcionamento desses
canais celulares, os médicos norte-americanos Peter Agre, 54, e
Roderick MacKinnon, 47, conquistaram o Nobel de Química.
Os canais de água e de íons (átomos com carga) elucidados pela
dupla mantêm alguns mecanismos básicos do organismo humano. Exemplos: os impulsos nervosos, a constância dos batimentos
cardíacos e a reabsorção correta
de água pelos rins (se prejudicada,
causa o diabetes insípido).
Qualquer bagunça nesse sistema extremamente azeitado de
transporte molecular pode causar
as mais variadas doenças. "Esse
tipo de ciência é muito básica,
mas ela dá uma contribuição
muito grande. Mutações que alteram esses transportadores celulares estão na origem de várias
doenças", afirma o médico Marcelo Morales, 34, do Instituto de
Biofísica Carlos Chagas Filho, na
UFRJ (Universidade Federal do
Rio de Janeiro).
Morales trabalhou ao lado de
Peter Agre na Universidade Johns
Hopkins, no Estado norte-americano de Maryland, entre 1993 e
1995. Ainda colabora com as pesquisas do laureado -tanto que
ajudou a organizar sua vinda para
o Brasil na próxima semana, para
o 5º Congresso Ibero-Americano
de Biofísica, que acontece a partir
do dia 12 no Rio de Janeiro.
"Ninguém dava trela para ele no
começo, porque não se acreditava
que houvesse um transportador
de água", recorda Morales. Uma
série de experimentos bem planejados, no entanto, ajudaram Agre
a provar o contrário.
Ele inseriu a proteína que suspeitava ser o portão de entrada da
água na membrana de algumas
células e deixou outras sem ela. As
que tinham a proteína-canal inflaram com a entrada do líquido,
enquanto as demais permaneceram com dimensões normais.
A nova proteína, cujo funcionamento foi elucidado em 1992, ganhou o nome de aquaporina-1
(AQP1). Diversas outras foram
achadas desde então, em quase
todos os seres vivos -prova de
que o fenômeno deve ser geral
(veja quadro à direita). Nos rins
humanos, por exemplo, a AQP1 e
a AQP2 ajudam a manter funcionando um sofisticado sistema de
reutilização da água corporal.
Se o trabalho de Agre já é dos
mais recentes para os padrões do
Nobel (que costuma premiar descobertas com décadas de idade),
as pesquisas de Roderick MacKinnon, da Universidade Rockefeller, em Nova York, praticamente aconteceram ontem. Foi só em
1998 que o médico e bioquímico
revelou a estrutura do canal de
íons de potássio, o primeiro a ser
explicado em detalhes.
Ninguém entendia como esse
íon conseguia adentrar certos canais celulares que não deixavam
entrar o sódio, menor, e que portanto deveria passar. MacKinnon
matou a charada examinando
cristais com a estrutura do canal
"congelada": os átomos de oxigênio dentro dele estavam dispostos
da mesma maneira que os das
moléculas de água fora da célula
-e por isso os íons de potássio se
difundiam naturalmente.
"O mecanismo de entrada do
íon de potássio é essencial para o
funcionamento de músculos e
neurônios", diz Célia Regina Garcia, 44, do Instituto de Biocências
da USP, para quem o trabalho
abre perspectivas farmacêuticas.
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