UOL


São Paulo, quinta-feira, 09 de outubro de 2003

Texto Anterior | Índice

Premiado pede liberdade de pesquisa na era Bush

FREE-LANCE PARA A FOLHA

Apesar da voz cansada e da maratona de entrevistas, Peter Agre se diz "absolutamente encantado" com o Nobel. De seu laboratório na Universidade Johns Hopkins, em Baltimore, ele falou por telefone de um de seus objetivos futuros: usar o dinheiro e o prestígio do prêmio para defender a liberdade de pesquisa científica, ameaçada pela política antiterrorismo de George W. Bush. (RJL)

Folha - Pelo que me contaram, o sr., ou pelo menos um de seus filhos, é fã da seleção brasileira.
Agre -
É verdade. Quem é aquele famoso goleiro de dez anos atrás? [Pausa.] Taffarel! É isso, nós temos uma camisa dele, foi Marcelo [Morales, pesquisador da UFRJ] que nos deu. Naquela época meu filho pequeno fazia parte de um time de futebol, e o goleiro da equipe gostava de usá-la -eles ficavam muito corajosos quando ele usava aquela camisa.

Folha - O sr. e MacKinnon se destacam entre os premiados deste ano por serem bem mais jovens e terem realizado suas descobertas há muito menos tempo. O sr. vê alguma razão especial para isso?
Agre -
Certamente não cabe a mim avaliar isso, mas a água é o principal componente do nosso corpo -e de plantas, insetos, microrganismos. É uma questão fundamental saber como a água chega aonde ela precisa ir.
Agora, por que eles nos escolheram no lugar de outros candidatos realmente merecedores do prêmio, honestamente não sei dizer. Com 54 anos, não me considero mais tão jovem, mas ainda espero ter alguns anos pela frente. Estou simplesmente encantado.

Folha - Que novas aplicações clínicas, além da melhor compreensão do diabetes, o sr. acha que o seu trabalho permitirá?
Agre -
Todas as secreções -lágrimas, suor, urina- estão envolvidas aí. Erros nessas cascatas bioquímicas podem causar doenças, mesmo em microrganismos. Por exemplo, o organismo causador da malária [micróbios do gênero Plasmodium] tem uma aquaporina que amigos nossos na Alemanha estão estudando. Esperamos que esse seja um mecanismo para tratar a malária, mas ainda não sabemos. Eu acho as possibilidades fantásticas, mas a realidade é que temos um monte de trabalho pesado à frente.

Folha - O que o sr. pretende fazer agora com o dinheiro do prêmio e em sua carreira como cientista? Agre - Bem, minha mulher cuida do dinheiro. Temos quatro filhos para os quais precisamos providenciar educação universitária. Temos tido a sorte de poder contribuir com vários programas ambientais e de educação e continuaremos a apoiá-los.
Também gostaria de ajudar a promover a liberdade de pesquisa científica. Espero que essas coisas não diminuam a celebração do Nobel, porque não é por isso que as câmeras estão aqui. Mas acho que essa é uma oportunidade de usar um pouco desse dinheiro e um pouco dos nossos esforços para perseguir esse objetivo.


Texto Anterior: Química: Canais das células dão Nobel a americanos
Índice


UOL
Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.