São Paulo, sábado, 10 de janeiro de 2004

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ESPAÇO

Base permanente no satélite seria primeiro passo para vôo tripulado a Marte; promessa é vista como manobra eleitoral

Bush vai anunciar volta do homem à Lua

Larry Downing/Reuters
George W. Bush fala a empresárias num evento em Washington


FERNANDO CANZIAN
DE WASHINGTON

O presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, vai anunciar na semana que vem a retomada de missões tripuladas à Lua e um ambicioso programa espacial com destino a Marte. O projeto incluiria a instalação de uma base habitada na Lua, que daria suporte a uma eventual expedição, em um segundo momento, ao planeta vermelho.
Os planos de "conquista" de Marte serão o segundo anúncio de impacto de Bush em 2004, ano em que o presidente tentará se reeleger para um mandato de mais quatro anos.
Na quarta-feira, Bush já havia delineado em termos gerais e genéricos uma nova política de imigração para os EUA que depende inteiramente da aprovação do Congresso, conservador nesse assunto. Especialistas consideraram o Plano de Imigração Temporária de Bush, que promete vistos a trabalhadores estrangeiros, apenas uma tentativa de atrair os votos dos cerca de 33 milhões de imigrantes que hoje vivem no país.
O novo plano de conquista do espaço vem embalado pelo sucesso da missão americana do robô Spirit, que pousou há poucos dias em Marte, e pela tentativa de Bush de unir os EUA em torno de um ambicioso projeto comum.
Embora Bush seja considerado favorito nas eleições de novembro, os EUA têm hoje um eleitorado praticamente dividido ao meio entre republicanos, que apóiam o presidente, e democratas.

"Momento Kennedy"
Analistas políticos afirmam que Bush deseja criar o que chamavam ontem de "momento Kennedy". Em 1961, o presidente democrata John F. Kennedy (1961-63) uniu os EUA em torno do sonho de conquistar a Lua, onde os norte-americanos pousariam em 20 de julho de 1969, a bordo do módulo de pouso da Apollo-11.
Embora seja a nação mais rica do planeta, os EUA não têm hoje dinheiro ou naves capazes de materializar a missão que Bush deve propor na quarta-feira próxima.
O custo das guerras no Iraque e contra o terrorismo e a política de afrouxamento fiscal para tirar o país de uma recessão levaram as contas americanas "para o espaço" já há algum tempo. Os EUA têm hoje um déficit fiscal recorde de US$ 500 bilhões, considerado na semana passada pelo FMI (Fundo Monetário Internacional) como um "risco significativo para o resto do mundo".
Em 1989, o ex-presidente George Bush pai (1989-93) também havia proposto retornar à Lua para depois tentar chegar a Marte. Na época, a estimativa de gastos da Nasa, a agência espacial americana, atingiu mais de US$ 400 bilhões, enterrando a iniciativa. Como comparação, o orçamento total da Nasa previsto para este ano é de US$ 15 bilhões.
Uma viagem só de ida à Lua pode ser feita em três dias. Já uma missão a Marte demandaria seis meses. Há também uma série de problemas -como disponibilidade de combustível, geração de energia e exposição dos astronautas a altos níveis de radiação- que os cientistas teriam de resolver (veja quadro abaixo, à dir.).
O anúncio de Bush ocorrerá quase um ano depois de o ônibus espacial Columbia ter se desintegrado durante sua volta à Terra. O acidente, investigado por uma comissão especial, acabou suspendendo até setembro próximo qualquer iniciativa da Nasa para novas missões.
Embora os EUA tenham três outros ônibus espaciais, o design das naves, de mais de 20 anos, já é considerado obsoleto para missões gigantescas como a que Bush pretende propor. Quando voltarem a voar, os ônibus espaciais norte-americanos devem continuar comprometidos com a construção da Estação Espacial Internacional (ISS, na abreviação em inglês), outro projeto ambicioso já iniciado e liderado pelos Estados Unidos. Atualmente, toda a manutenção da ISS depende dos foguetes russos.

Resposta à China
Além das intenções eleitorais, alguns analistas vêem questões de hegemonia por trás das ambições espaciais de Bush. O anúncio seria uma resposta à China, que em outubro passado tornou-se o terceiro país do mundo (além dos EUA e da ex-União Soviética) a lançar uma missão tripulada ao espaço.


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