São Paulo, quarta-feira, 10 de julho de 2002

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54ª REUNIÃO ANUAL DA SBPC

Pesquisa apresentada durante simpósio em Goiânia afirma que estatísticas atuais subestimam a população do campo no país

Um terço do Brasil é rural, diz economista

Joel Silva/Folha Imagem - 18.abr.2002
Fazenda de café com irrigação mecanizada na região de Cravinhos (294 km ao norte de São Paulo)


RICARDO BONALUME NETO
ENVIADO ESPECIAL A GOIÂNIA

O Brasil vai deixar de ter população rural em 2030, se continuarem sendo usados os critérios atuais para definir o grau de urbanização do país. Esse absurdo, teórico e prático, foi apontado ontem pelo pesquisador da USP, José Eli da Veiga, em palestra realizada na 54ª Reunião Anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência).
Para Veiga, é falso dizer que o Brasil hoje tem 82% de sua população nas cidades, como afirmam as estatísticas tradicionais. "Um terço do Brasil é tipicamente rural", diz ele, que critica o fato de todo município no Brasil ser considerado "cidade".
Isso acaba criando contradições curiosas, como ocorre em dois mapas no atlas do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) publicado em 2000.
O mapa referente à urbanização mostra como regiões muito urbanizadas em Roraima, no Pantanal mato-grossense e na região da campanha do Rio Grande do Sul. Já o mapa de densidade populacional mostra essas áreas como escassamente povoadas.
Isso acontece porque o país tem 5.562 municípios e quase 10 mil distritos. "É altamente problemática a diferença entre rural e urbano no Brasil", diz ele. A partir dos anos 50, os sociólogos brasileiros, por exemplo, começaram a classificar como rurais os aglomerados com menos de 20 mil habitantes.
Veiga estima que a rede urbana básica do país esteja concentrada num grupo de apenas 455 municípios, onde moram 56,7% dos habitantes do país.

Cidades imaginárias
Veiga, professor da Faculdade de Economia e Administração da USP, aproveitou para lançar ontem um livro com coletânea de artigos com o significativo título "Cidades Imaginárias - O Brasil é menos urbano do que se calcula" (Editora Autores Associados, Campinas, 2002).
Baseado em critérios de densidade demográfica, ele calcula que existe uma categoria intermediária de municípios -10% deles, onde vivem 13% dos habitantes- que não são nem indiscutivelmente urbanos, nem essencialmente rurais.
As próprias definição e identificação de êxodo rural ficam mais complexas, pois houve municípios rurais que aumentaram sua população acima da média nacional, atraindo a população em torno, enquanto outros acabaram ficando esvaziados.
Veiga defende que esse "Brasil rural" escondido seja alvo de um programa governamental "especialmente voltado ao seu desenvolvimento sustentável".
Essa sustentabilidade na área rural foi o tema de outro debate realizado em seguida sobre tecnologias alternativas para aplicação em agricultura e pecuária.

Rede de pesquisa
Eduardo Delgado Assad, da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) em Campinas (SP), comentou a importância para o país da rede nacional de agrometeorologia e dos trabalhos de zoneamento agrícola.
"Cerca de 95% dos problemas são causados por chuva e seca", disse Assad, que lembrou um estudo de perdas no campo feito com as safras de 91/92 e 92/93. As perdas variaram de 16% da soja plantada em São Paulo a 81% do algodão na região Nordeste.
A colaboração de uma rede de 27 instituições de pesquisa e 60 pesquisadores dividiu o país em até agora 25 diferentes zonas pluviométricas (de chuva) homogêneas, e a criação de índices de risco divulgados a cada cinco dias que permitem tentar reduzir os riscos do clima no plantio.
Com isso se pôde racionalizar a concessão de crédito rural, que chegou ao recorde atual de R$ 21 bilhões, diz ele. Esse crédito está na raiz, diz ele, de um agronegócio da ordem de R$ 315 bilhões, o equivalente a 30% do PIB (Produto Interno Bruto).



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