São Paulo, sábado, 10 de agosto de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

MEDICINA

Animais artificiais feitos de PVC são adotados pela Unifesp para ensinar os estudantes a realizar microcirurgias

Cobaia de plástico salva a pele de ratinhos

Divulgação
Rato de verdade assiste uso de cobaia de PVC em microcirurgia


SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

A Unifesp (Universidade Federal de São Paulo, antiga Escola Paulista de Medicina) está introduzindo uma técnica para procedimentos microcirúrgicos que vai salvar muitas vidas -de ratos. Chega ao país a cobaia de PVC.
Fabricado totalmente a partir dessa espécie de plástico (cujas moléculas são compostas por longas cadeias de átomos de carbono, conhecidas como polímeros), o modelo foi desenvolvido por uma ONG da Holanda e apresentado naquele país há três anos.
"Nós começamos com a idéia de desenvolvê-lo em 1994 e concluímos o trabalho na Holanda em 1999", conta René Remi, um farmacologista e especialista em animais de laboratório que ajudou a desenvolver o animal de mentira.
Remi está no Brasil divulgando a inovação. Faz parte da Microsurgical Developments, a instituição sem fins lucrativos que desenvolveu o sistema, hoje fabricado pela gigante belga Solvay Pharmaceuticals.
A idéia é substituir cobaias vivas no processo de aprendizado de microcirurgias. "Atualmente, quando um aluno precisa aprender a operar, ele tem de prestar atenção em duas coisas: na execução correta da técnica e nos cuidados para que o animal não morra", diz Remi. "Ele simplesmente não consegue prestar atenção nas duas coisas, e o animal morre."
"Depois de matar um, dois, três, quatro ratos, ele chega para o professor e diz: "Faça isso você. Eu não sei fazer direito"." Com o rato de PVC, os dois aprendizados são feitos separadamente, tornando o processo menos traumatizante para o aspirante a médico.

Reprodução quase exata
O rato de PVC reproduz fielmente as texturas dos tecidos do animal. Os órgãos internos são reproduzidos na região abdominal e no pescoço do bicho. "Isso permite o aprendizado de cerca de 25 técnicas diferentes de microcirurgia com o modelo", diz Remi.
O custo dos ratos de PVC pode parecer maior do que o de usar cobaias vivas, mas é ilusão. "Uma cobaia artificial custa US$ 160. Um rato de verdade, levando em conta tudo o que se gasta para tratá-lo, acondicioná-lo e alimentá-lo, custa US$ 40. Mas um rato vivo, uma vez usado, precisa ser descartado. O rato de PVC pode ser usado milhares de vezes."
A cobaia artificial é acompanhada por um programa de computador, que ajuda o aprendiz a simular os procedimentos pré-operatórios (anestesia, preparação do animal) e avisa se algo está saindo errado e oferece, no momento da operação, uma simulação dos sinais vitais do animal. "Mas não há conexão entre o rato e o computador, os dois funcionam separadamente", diz Remi. Assim, o computador não pode reagir a um erro médico cometido durante a cirurgia e "matar" o rato de PVC.

Salvando vidas
Para Remi, a principal motivação do trabalho é a redução da perda de vidas. Ele diz que, só na Holanda, cerca de 7.500 ratos foram salvos pela cobaia artificial. "Se pensarmos nesses números para o mundo todo, podemos multiplicar isso por cem", diz.
Entretanto, há um limite para a tecnologia. "Acho muito improvável que consigamos desenvolver um rato artificial totalmente funcional para pesquisas e aprendizado. Já sabemos muito sobre ratos, mas não o suficiente para reproduzir totalmente o sistema deles, que é muito complexo."
E, eventualmente, os alunos de medicina precisam encarar os bichinhos de verdade na sala de operação. A esperança é que, quando chegarem lá, eles já terão dominado a técnica e precisarão ter em mente apenas uma preocupação -a de proteger a vida e o bem-estar de seus pacientes.










Texto Anterior: Biotecnologia: Nova terapia genética ataca Aids e pólio
Próximo Texto: Panorâmica - Espaço: Grupo quer atacar asteróide com sondas
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.