São Paulo, domingo, 10 de dezembro de 2000

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ASTRONÁUTICA
Camadas plásticas e metálicas das roupas que levaram o homem à Lua não foram projetadas para durar
Trajes históricos estão se decompondo

Nasa
Buzz Aldrin é fotografado por Neil Armstrong ao lado do módulo lunar da Apolo-11, em 1969


WARREN E. LEARY
DO "THE NEW YORK TIMES"

Para quem permaneceu acordado durante as alunissagens nas missões Apolo, as imagens mais inesquecíveis enviadas à Terra foram as dos astronautas em trajes espaciais fantasmagóricos brancos, emoldurados pela paisagem cinza de um outro mundo.
Protegidos por seus trajes do inóspito ambiente lunar, aqueles homens saltitavam pelo terreno poeirento, davam voltas pelo local em seus jipes, apanhavam pilhas de rochas e até arremessavam bolas de golfe sobre o horizonte.
Agora, as roupas que tornaram isso possível, trajes multicamadas que ainda fascinam visitantes de museus de ciência no mundo todo, estão em perigo. Com a deterioração imprevista de alguns de seus materiais, os especialistas dizem que os antes duráveis trajes lunares estão se desintegrando e podem não sobreviver para serem vistos pelas gerações futuras.
O problema é particularmente agudo com os trajes da série Apolo, vestimentas projetadas para encapsular um astronauta como uma nave sob medida. Composto por 24 camadas de materiais sintéticos e naturais, esse equipamento rude consome lentamente a si mesmo, com a degradação de alguns dos plásticos, que corroem componentes adjacentes.

Feitos para durar
"A deterioração dos trajes Apolo é algo surpreendente porque foram construídos para sobreviver às mais duras condições no espaço e seria de esperar que sobrevivessem a qualquer coisa", diz Linda Young, do Museu Nacional do Ar e do Espaço da Smithsonian Institution, em Washington. Young, especialista na conservação de materiais, está coordenando um programa para avaliar o problema dos trajes e detê-lo.
O projeto, que já tem dois anos, é custeado pela organização Save America's Treasures (Salve os Tesouros dos Estados Unidos), um esforço de preservação histórica de indústrias, fundações privadas e do governo dos EUA.
O museu tem a maior coleção de trajes espaciais históricos do mundo, com mais de 250 roupas.
Mais de 25 especialistas dos EUA e de outros países fazem parte de um grupo consultivo para elaborar, até agosto de 2001, diretrizes quanto ao manuseio e armazenamento dos trajes.
Cada traje espacial da coleção está sendo minuciosamente examinado, para definir sua condição e uma base para o monitoramento futuro. Esse exame inclui fotografias exaustivas de cada componente, testes de acidez e outras características químicas, registro das variações de cor das partes têxteis e o uso de raios X.
O programa também está identificando os subprodutos da degradação e suas origens, assim como meios para combater as substâncias destrutivas.
Max Ary, presidente do Centro do Espaço e da Cosmosfera do Kansas, que expõe e conserva uma grande coleção de trajes espaciais da Smithsonian, diz que sinais de degradação nas roupas da era Apolo foram notados de 10 a 15 anos atrás, mas que ninguém percebera então sua gravidade.

Ferramentas X Relíquias
A Nasa (agência espacial dos EUA) projetou os trajes lunares para serem usados em apenas uma missão, em tarefas bastante específicas. Ela não pensou em preservação naquele momento. "A Nasa não está no ramo de construção de artefatos", diz. "Ela queria que os trajes fizessem uma coisa -proteger a vida dos astronautas- e só isso importava."
Várias áreas com problemas foram identificadas em torno dos materiais plásticos e sintéticos usados nos trajes espaciais.
Os curadores do Museu do Ar e do Espaço estão procurando vários meios de proteger os trajes espaciais, guardando-os em compartimentos preenchidos totalmente com gás nitrogênio (ar sem oxigênio), uma opção bastante custosa. Também pode ser possível achar um revestimento químico que proteja algumas peças, ou formas de limpar os materiais e reduzir sua corrosão.
A maioria dos especialistas trabalhando no projeto de preservação dos trajes espaciais dos EUA diz acreditar que muito de seu trabalho é apenas uma ação para retardar o processo e que as roupas devem continuar a se decompor nas próximas décadas.
"Nenhuma dessas roupas vai sobreviver no final", diz Mary Baker, uma química de polímeros e curadora de museu. "Em 500 anos, haverá uma Mona Lisa. Mas não haverá um traje da Apolo."


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