São Paulo, quarta-feira, 11 de abril de 2001

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NEUROLOGIA

Partículas retrovirais dormentes no genoma humano poderiam causar doença mental, indica pesquisa nos EUA

Estudo relaciona esquizofrenia com vírus

DA REDAÇÃO

Fragmentos semelhantes a genes de vírus foram encontrados no fluido cerebrospinal (líquido do encéfalo e da medula espinhal) e no tecido cerebral de pacientes com esquizofrenia, revela estudo publicado na edição desta semana da revista da Academia Nacional de Ciências dos EUA, a "PNAS" (www.pnas.org).
A pesquisa traz indícios de que vírus possam estar envolvidos no desenvolvimento dessa doença mental em até um terço dos casos. Se a relação for comprovada em novos estudos, abre a perspectiva de apoiar o tratamento da doença com drogas antivirais.
Esquizofrenia é o nome geral de um grupo de desordens psicóticas caracterizadas por delírios e alucinações. Mudanças no funcionamento do cérebro também foram identificadas, mas suas causas permanecem desconhecidas.
Um grupo de cientistas liderados por integrantes da Escola de Medicina da Universidade Johns Hopkins (EUA) examinou 35 pacientes alemães diagnosticados como esquizofrênicos.
Eles encontraram a impressão digital molecular de retrovírus (leia texto à direita) no fluido cerebrospinal de 29% dos pacientes diagnosticados com esquizofrenia aguda. Também foram encontrados vírus em 7% dos pacientes que apresentavam uma forma crônica da doença.
Em contraste, os genes dos retrovírus não estavam presentes no cérebro ou no fluido cerebrospinal de pessoas sadias, ou que apresentassem outras formas de doenças neurológicas.
"Os resultados sugerem que os vírus estejam envolvidos no processo", disse Robert Yolken, coordenador do estudo. "Não sabemos dizer, no entanto, se o vírus é a causa de alguns dos casos de esquizofrenia, ou se ele é (apenas) ativado durante o processo."
Basicamente, os cientistas encontraram o vírus na cena do crime, mas ainda precisam trabalhar muito para saber se ele é o criminoso, ou apenas um espectador inocente. Se os vírus forem a causa da esquizofrenia, Yolken afirmou que terapias antivirais poderiam funcionar no tratamento da desordem, que atinge 1% das pessoas no mundo.
Os pesquisadores dizem que a maior frequência de genes retrovirais encontrados em pacientes recém-diagnosticados com esquizofrenia (e não naqueles com a doença crônica) indica que a ativação desses genes pode contribuir para o surgimento e a progressão inicial da doença em alguns desses indivíduos.

Fator genético e ambiental
A impressão digital encontrada no estudo é o RNA retroviral criado pela ativação de um retrovírus endógeno do homem, que pertence à família W (Herv-W). Retrovírus endógenos são partículas virais "adormecidas" entre os genes de um organismo.
Pesquisas anteriores já haviam sugerido que a ativação de vírus e o surgimento de certos tipos de esquizofrenia são causados tanto por fatores genéticos quanto ambientais. O novo estudo aponta para os retrovírus do tipo Herv-W como candidatos principais no quesito componente ambiental de alguns casos de esquizofrenia.
No entanto, os cientistas não sabem dizer se essas sequências virais são resultado da infecção por retrovírus semelhantes aos Hervs vindos de fora do organismo ou da ativação de Hervs já incorporados no genoma humano. A aparente incapacidade de multiplicação dessas partículas sugere, porém, que a infecção exógena é a hipótese menos provável.
Yolken afirmou que está projetando uma série de testes clínicos, para vários estágios da doença, com o objetivo de verificar se medicamentos antivirais poderiam alterar o curso da esquizofrenia.
Em outro estudo, publicado na mesma edição da "PNAS", cientistas alemães encontraram cinco genes associados com a formação e a manutenção da bainha de mielina (capa que envolve os nervos e é fundamental para a transmissão de sinal ao longo das fibras nervosas). Esses genes, dizem os pesquisadores, costumam estar desligados nos pacientes esquizofrênicos. Os resultados sugerem falhas funcionais específicas que causariam a doença.



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