São Paulo, sábado, 13 de agosto de 2005

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MEDICINA

Análise molecular indica que cânceres naquela região são iniciados no estômago;achado pode facilitar diagnóstico

Tumor de esôfago esconde a sua origem

CLÁUDIA COLLUCCI
DA REPORTAGEM LOCAL

O câncer do esôfago começa na realidade no órgão vizinho, o estômago. É o que sugere uma pesquisa do Hospital do Câncer e do Instituto Ludwig de São Paulo, que será capa da próxima edição do periódico "Cancer Research" (cancerres.aacrjournals.org).
Se confirmada essa hipótese, o estudo será o ponto de partida para novos métodos de diagnóstico da doença que, em geral, é identificada tardiamente e mata, em média, 6.000 brasileiros por ano.
O tumor do esôfago está entre os dez tipos com maior incidência no país. Para este ano, são previstos 10.590 casos novos deste câncer, segundo o Inca (Instituto Nacional do Câncer).
Há dois tipos de câncer do esôfago: o epidermóide e o adenocarcinoma, que afeta principalmente a região próxima à transição do estômago para o esôfago. Foi esse o tipo de câncer estudado na pesquisa que envolveu 71 pacientes do Hospital da Câncer.
Segundo o oncologista Rubens Antonio Aissar Sallum, que participou da pesquisa, nas últimas décadas, a taxa de incidência do adenocarcinoma saltou de 10% para 30% dos casos em São Paulo -e para 50% na Europa.
Os principais fatores de risco para esse tumor são obesidade, doença do refluxo (em que sucos gástrico e biliar invadem o esôfago), cigarro, álcool e alta concentração de nitratos e nitritos em razão do consumo de embutidos, conservantes e alimentos com altas doses de agrotóxicos.
O médico explica que essas agressões provocam uma inflamação crônica no tecido normal do esôfago, que passa a ter um outro revestimento, formado pelas chamadas células colunares. Essa troca celular é chamada de esôfago de Barrett, problema que, historicamente, sempre foi relacionado ao câncer de esôfago.
A nova pesquisa deve mudar esse cenário. A equipe liderada pelo médico Luiz Fernando Lima Reis analisou o perfil molecular dos diferentes tecidos envolvidos nesse processo, como do revestimento da cárdia (região do estômago muito próxima à linha de transição com o esôfago), do esôfago normal, do esôfago de Barrett e do adenocarcinoma.
A surpresa da equipe veio quando verificou-se que o perfil molecular do tumor está mais próximo das células do estômago do que daquelas do esôfago de Barrett.
Levantou-se a possibilidade de que as células tumorais do esôfago surjam na cárdia e migrem, através dos vasos linfáticos, para outras regiões do esôfago. "Ainda será necessária a investigação de mais casos para que a hipótese seja corroborada", diz Sallum.
Inédita, a metodologia desenvolvida pelos brasileiros, que envolveu modelos matemáticos desenvolvidos pela USP, deverá ser aplicada por grupos estrangeiros.
Se comprovada a hipótese, Sallum acredita que será possível uma investigação diagnóstica mais precoce desse tipo de câncer. "Pode ser que não se valorize mais tanto o esôfago de Barrett e sim a região da cárdia", diz ele.
Outra novidade do trabalho foi estudar as vias metabólicas celulares alteradas nos diferentes tipos de tecidos e não buscar os genes causadores dos tumores.
Segundo Lima Reis, essa informação pode levar à criação de testes preditivos mais precisos, que permitirão, no futuro, a intervenção médica antes de o processo tumoral se instalar no organismo.


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