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ARQUEOLOGIA
Sedimentos marinhos mostram que quatro períodos de estiagem antecederam a decadência daquele povo
Secas provocaram declínio dos maias, confirma pesquisa
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
A falta d'água levou ao colapso a
civilização maia, uma das mais
importantes da América, antes da
chegada dos colonizadores europeus. Novos estudos com sedimentos do fundo do mar, feitos
por pesquisadores nos EUA e na
Suíça, mostraram que um longo
período de estiagem, incluindo
quatro secas severas, caracterizou
o momento de decadência dos
maias, nos séculos 9 e 10 d.C.
A civilização maia localizava-se
na região compreendida pelo sul
do México, Guatemala e Belize.
Ela estava no auge do seu desenvolvimento cultural quando começou o colapso, caracterizado
por exemplo pelo abandono pela
população das suas grandes cidades. Uma delas, Tikal, chegou a
ter 60 mil habitantes, e hoje é um
grande conjunto de ruínas tomado pela floresta tropical.
Como a escrita maia só começou a ser aos poucos conhecida a
partir dos anos 50 do século passado, essa civilização e o seu fim
constituíam um grande mistério.
Além da mudança no clima, as
hipóteses para o colapso envolvem a exploração excessiva de um
ecossistema frágil, revoltas internas ou o constante estado de
guerra externa.
Os achados arqueológicos revelam a importância da água para os
maias. As cidades maias têm estruturas para coleta da água da
chuva, além de conterem um
grande número de reservatórios.
As primeiras pistas sobre as secas que teriam afetado essa civilização foram estudos feitos com
sedimentos em lagos na península de Yucatán, sul do México. Segundo o estudo de David Hodell, da Universidade da Flórida, publicado pela revista científica
"Science" em 2001, haveria um ciclo de seca de 208 anos, um dos
quais em torno do ano 900 d.C.
Testemunho distante
A nova pesquisa está publicada
na edição de hoje da mesma revista, assinado por Gerald Haug, do
Instituto Federal Suíço de Tecnologia, de Zurique, e mais cinco colaboradores.
Eles pesquisaram os sedimentos
da bacia de Cariaco, no litoral da
Venezuela, caracterizada por ser
um leito oceânico com pouco oxigênio e, portanto, pouco revirado
por seres vivos.
Os sedimentos que ali se acumulam têm origem em parte em
terra, levados pelos rios, principalmente durante o verão tropical
(época mais chuvosa).
Em outro momento, no inverno, mais seco, os sedimentos vêm
do próprio oceano, quando há
maior concentração de organismos vivos na superfície e consequente deposição de microfósseis
no leito oceânico.
O resultado é visível, com faixas
de sedimentos mais escuros, de
origem terrestre, e outras de sedimentos claros, de origem marinha, se alternando, criando um
registro da intensidade das estações seca e chuvosa por milhares
de anos. Os pesquisadores usaram a variação na quantidade do
elemento químico titânio nessas
faixas para montar o quadro da
mudança climática antiga.
Ligação
A bacia de Cariaco está situada
no limite norte da chamada Zona
de Convergência Intertropical
(ITCZ), linha climática na qual
ventos dos hemisférios norte e sul
se encontram, afetando o regime
de chuvas. A bacia e a península
de Yucatán estão na mesma área
de influência da convergência.
Além de mostrar uma tendência geral a um clima mais seco durante o período conhecido como
era clássica tardia da civilização
maia (de 600 a 900 d.C.), o registro
do titânio nos sedimentos indicou
secas intensas durante os anos
760, 810, 860 e 910 d.C.
"Padrões recorrentes de seca tiveram um papel importante na
complexa história dos maias. A
civilização maia se desenvolveu
em um deserto sazonal e dependia de um ciclo de chuva consistente para apoiar a produção agrícola", afirmam Haug e colegas.
De 750 a 950 d.C. ocorreu o
grande desastre demográfico,
com a concentração da população
caindo de cerca de 200 para 100
habitantes por quilômetro quadrado e o abandono de várias cidades-Estado.
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