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Genoma do esquistossomo traz pista para remédios
Mais de 60 drogas já existentes podem combater parasita, revela sequenciamento
Doença causada pelo verme, comum em países pobres, pode ceder a medicamentos hoje usados contra outros males, dizem pesquisadores
RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL
Desta vez a "sopa de letrinhas" do sequenciamento genético produziu resultados
imediatos. A análise do genoma
de dois dos parasitas que causam a esquistossomose já rendeu 66 prováveis remédios para a doença, já disponíveis nas
farmácias e que agora podem
ser testados contra ela.
Nada mal, considerando-se
que hoje apenas uma droga, o
praziquantel, é usada para tratar uma doença que atinge 210
milhões de pessoas em 76 países (até 6 milhões no Brasil).
Os genomas foram sequenciados por dois grandes consórcios. A equipe liderada por Najib El-Sayed, da Universidade
de Maryland (EUA), soletrou o
DNA do verme Schistosoma
mansoni, disseminado principalmente na África, no Brasil e
no Caribe. Pesquisadores de
São Paulo e Minas Gerais participaram deste trabalho.
Já o grupo liderado por Zhu
Chen, do Centro Nacional Chinês do Genoma Humano, de
Xangai, decodificou o genoma
do Schistosoma japonicum,
mais comum na Ásia. As duas
equipes publicam seus resultados hoje na revista "Nature".
"O genoma tem esse efeito
catalisador. Todo mundo que
trabalha com esquistossomose
vai ter acesso aos dados. Ele
abre o caminho para testar essas drogas", afirma Ricardo De
Marco, do Instituto de Física
da USP de São Carlos.
A equipe de El-Sayed determinou a sequência de 363 milhões de nucleotídeos, as "letras" que compõem o DNA. As
letras formam ao menos 11.809
"palavras", os genes que regulam a vida do esquistossomo.
De Marco analisou pequenas
sequências de DNA que permitem a um mesmo gene produzir diferentes proteínas. "Esse
monte de proteínas pode agir
como uma cortina de fumaça,
escondendo o parasita do sistema imune", diz o pesquisador.
"Se entendermos o mecanismo
de escape, pode ser possível
inibi-lo", diz De Marco.
O sequenciamento do S.
mansoni foi planejado de modo
a ajudar na descoberta de alvos
no parasita que poderiam ser
atacados com drogas.
A Organização Mundial da
Saúde chama de "negligenciadas" doenças como esquistossomose, pois são males principalmente de países pobres e
que despertam pouco interesse
das companhias farmacêuticas.
Achar uma droga já no mercado, de preferência de uso oral, é
a estratégia mais factível.
Uma pesquisa em bancos de
dados de química médica revelou 240 pedaços do genoma do
Schistosoma mansoni que batem com alvos conhecidos de
drogas já disponíveis.
Selecionar as drogas pela potência e facilidade de uso rendeu 66 remédios já encontráveis nas farmácias e usados para tratar outras doenças. Graças ao genoma, pesquisadores
de todo o mundo já podem planejar testes com elas.
O genoma também dá pistas
sobre como o verme consegue
infectar. Uma boa quantidade
de genes codifica enzimas que
quebram proteínas, necessárias para o parasita "navegar"
pelo corpo atravessando pele e
diferentes tecidos celulares.
Ele também tem bom número
de genes ligados a um complexo sistema sensorial que detecta estímulos como luz, temperatura e compostos químicos.
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