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São Paulo, sábado, 16 de agosto de 2003

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ASTRONÁUTICA

Segredo militar cerca operação que fará a terceira tentativa brasileira de enviar satélite à órbita da Terra

Foguete nacional deve voar até fim do mês

SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

A terceira tentativa brasileira de lançar um satélite ao espaço está às vésperas de acontecer. Os trabalhos no foguete VLS-1 já estão a todo o vapor no Centro de Lançamento de Alcântara, no Maranhão, e a perspectiva é realizar o vôo entre quarta-feira e o final deste mês. Mas, ao contrário do que ocorreu nas duas ocasiões anteriores, a transparência não está sendo o forte da atual campanha.
A data exata ainda não foi divulgada, mas, segundo o presidente da AEB (Agência Espacial Brasileira), Luiz Bevilacqua, não passa do fim de agosto. "Na prática, deve ser entre os dias 20 e 29", disse.
Embora a AEB, responsável pelo programa civil de exploração do espaço, informe estar acompanhando de perto a evolução dos trabalhos no lançador, todo o controle de divulgação e administração dos trabalhos está sob comando militar.
O lançamento está envolto por uma aura de mistério, e o único órgão autorizado a dar informações é o Cecomsaer (Centro de Comunicação Social da Aeronáutica). Até mesmo o pesquisador-chefe responsável por um dos satélites a serem lançados pelo VLS não sabe quando o foguete deve subir. Não sabe sequer quando será chamado a Alcântara para acompanhar os trabalhos com o sistema que ajudou a projetar.
A imprensa não poderá acompanhar o lançamento a partir de Alcântara, como na última aparição do VLS, em 1999. Segundo o Cecomsaer, jornalistas só poderão visitar a base na próxima terça, véspera da primeira data.
Os setores de comunicação da AEB, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) e de universidades envolvidas não estão liberados para dar informações sem autorização da Aeronáutica.
Mauro Dolinsky, engenheiro do CTA (Centro Técnico Aeroespacial) que participa da coordenação do lançamento, disse estar proibido de falar com a imprensa.

Importância estratégica
Pode parecer exagero, mas o fato é que todo cuidado é pouco quando se fala em lançamento do VLS. Desenvolvido ao longo de duas décadas, ele é um dos projetos mais importantes do programa espacial brasileiro. Segundo os planos originais, o VLS deveria passar por quatro vôos de qualificação. Os dois primeiros, realizados em 1997 e 1999, foram malogrados. O terceiro está sendo planejado desde 2001, mas só agora surgiram os recursos para conduzi-lo. Um terceiro fracasso poderia bem levar ao cancelamento.
Seria uma perda tecnológica e estratégica. Foguetes lançadores entram na lista das tecnologias duais, que servem a finalidades tanto civis quanto militares. Em linhas gerais, a diferença entre um lançador e um míssil balístico intercontinental (capaz, por exemplo, de levar uma bomba ao outro lado do mundo) não é apreciável. Por essa razão os EUA não simpatizam com o desenvolvimento de um lançador brasileiro e fazem oposição ao programa nacional.

Missão completa
Bevilacqua está confiante de que desta vez o VLS cumprirá a primeira missão espacial brasileira completa (em que um veículo nacional, de uma base nacional, lança um satélite nacional). "Sou capaz de apostar um jantar no "Famiglia Mancini" [restaurante de São Paulo] que em setembro estaremos comemorando o primeiro lançamento de um satélite por um lançador brasileiro."
Alguns engenheiros ligados ao programa espacial (mas não envolvidos no projeto) não ecoam o otimismo de Bevilacqua. Um deles, que pediu para ter seu nome omitido, até solicitou convite para o jantar, sugerindo a improbabilidade de sucesso absoluto.
O foguete tem quatro estágios movidos a propelente sólido, que dificulta manobras de precisão e impede o desligamento do motor no caso de problemas. Nos lançamentos anteriores, as falhas ocorreram no primeiro e no segundo estágios. Dois deles, portanto, nunca chegaram a fazer um teste com o conjunto.
Na nova tentativa, o VLS-1 carregará dois satélites. Um deles, Satec-1, foi desenvolvido pelo Inpe e testará várias tecnologias espaciais. O outro, Unosat, é um nanossatélite da Unopar (Universidade Norte do Paraná). Com apenas 8,8 kg, transmitirá dados de telemetria e uma gravação de voz, capaz de ser detectada por rádio amador (FM, 148,135 MHz), coisa parecida com o que fez o primeiro satélite artificial, o soviético Sputnik, em 1957. Se tudo correr bem como Bevilacqua supõe, o Sputnik brasileiro está a caminho.


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