São Paulo, Sábado, 17 de Julho de 1999
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REUNIÃO DA SBPC
Pesquisador brasileiro radicado na França diz que mudança deve considerar diferenças regionais
Físico critica reforma universitária

RICARDO BONALUME NETO
enviado especial a Porto Alegre


A reforma das universidades brasileiras, como está sendo gestada pelo Ministério da Educação, não leva em conta as principais funções dessas instituições.
É o que disse ontem, na 51ª reunião anual da SBPC (Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência), um dos mais renomados pesquisadores brasileiros, o físico Roberto Salmeron, há 31 anos na França e hoje professor da Escola Politécnica, em Paris.
"A função fundamental da universidade é fazer gente competente, não pesquisar tecnologia", declarou o físico.
Para Salmeron, uma reforma das universidades públicas deve levar em conta as diferenças regionais. Autonomia universitária não significa dar liberdade aos reitores de demitir e contratar professores e funcionários, mas sim dar condições às universidades de terem estruturas diferentes, de acordo com as regiões do país em que estão.
Ele também acredita que a avaliação dos pesquisadores deve ser feita "pelos pares", isto é, colegas de outras instituições, do modo rigoroso como é feito na França.
Perguntando à platéia qual seria o tamanho ideal de uma universidade, Salmeron respondeu que algumas das universidades brasileiras são grandes demais e citou como exemplo as duas maiores - USP (Universidade de São Paulo) e UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro).
"Elas têm institutos de física com 200 professores e 7.000 alunos. Um grupo de pesquisa eficiente deve ter uns 20 físicos e mais 30 alunos", diz ele, que acha que instituições muito grandes têm problemas administrativos.
"USP e UFRJ deveriam ser divididas em duas, com uma parte voltada para a área tecnológica."
Mais grave que a forma como se organizam é a situação financeira precária, "que impede que se concentrem em questões essenciais".
Salmeron tem larga experiência de modelos anteriores de universidade, no Brasil e no exterior. Ele lembrou a ação do educador Anísio Teixeira em criar a extinta Universidade do Distrito Federal, no Rio de Janeiro.
Para Anísio Teixeira, "a universidade tem de ser o local de criação intelectual, o que contava era a criatividade". Por isso, deram aula na Universidade do Distrito Federal personalidades importantes da cultura do país -"Villa-Lobos deu aula de música; Portinari, de pintura", diz Salmeron; Mário de Andrade, Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda também foram professores.
Ao contrário da liberdade de currículo que essa instituição tinha, a Universidade do Brasil, que depois viraria a UFRJ, foi iniciada pelo governo federal com um detalhismo que coibia a criatividade, diz o físico.
O mesmo aconteceria, de modo ainda mais dramático, na Unb (Universidade de Brasília), criada por Anísio Teixeira no começo da década de 60 e da qual vários professores foram sumariamente demitidos após o movimento militar de 1964.



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