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BIOTECNOLOGIA
Técnica pode ajudar planta a evitar ataque de bactéria; gene de vírus também está sendo testado na Esalq
Maracujá transgênico tem DNA de inseto
REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Pesquisadores da Esalq (Escola
Superior de Agricultura Luiz de
Queiroz), na USP de Piracicaba,
estão preparando um contra-ataque biotecnológico para enfrentar
as doenças que afetam o maracujá. São maracujazeiros transgênicos, carregando DNA de mariposas e vírus, que devem começar a
ser testados em fevereiro.
Os vilões que as versões modificadas da planta (cujo nome oficial, para os cientistas, é Passiflora
edulis) deverão superar são o vírus causador do endurecimento
dos frutos e a bactéria Xanthomonas campestris, que gera a chamada mancha oleosa dos frutos.
"O problema do vírus, principalmente, é gravíssimo", afirma
Maria Lúcia Carneiro Vieira, 48,
pesquisadora do Departamento
de Genética da Esalq e coordenadora do estudo. Na primeira
doença, o vírus torna a fruta imprestável para o consumo, enquanto a X. campestris pode até
levar o maracujazeiro à morte.
Os patógenos estão entre as
principais ameaças às plantações
brasileiras, cuja produção rende
cerca de R$ 80 milhões por ano,
de acordo com o IBGE (Fundação
Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística). O Brasil é o maior
produtor mundial da fruta e de
seu suco, respondendo por 90%
do total consumido no planeta.
Vieira explica que a idéia de utilizar um gene de mariposa para
fortalecer as defesas do maracujá
vem das propriedades bactericidas de uma proteína da hemolinfa
(o equivalente do "sangue" nos
insetos). Essa substância foi isolada da mariposa Trichoplusia ni,
ela própria uma praga agrícola
que ataca o repolho e outras plantas do gênero Brassica em países
temperados. "É um sistema defensivo do inseto contra infecções
por bactérias, que não conseguem
se multiplicar pela ação da proteína", diz a pesquisadora.
Transferência gênica
O grupo, portanto, decidiu
transferir o gene cuja sequência
de "letras" químicas de DNA contém a receita básica da proteína
bactericida para as plantas. "Por
enquanto, estamos trabalhando
com uma gama de construções
[de DNA], já que ainda não sabemos qual vai ser mais eficaz", explica Vieira. Além do gene de interesse, a sequência inserida no
maracujá leva também um promotor -um trecho de DNA que
especifica como e quando a proteína deverá ser produzida.
Para transferir o gene, os cientistas usaram dois métodos bastante comuns para a criação de
transgênicos. São a chamada biobalística (em que o gene é colocado dentro de projéteis microscópicos de ouro e bombardeado sobre a planta) e a Agrobacterium
tumefaciens, outra bactéria que
domina há milhões de anos a técnica de transferir DNA para o núcleo das células vegetais.
Os pesquisadores já conseguiram demonstrar que a proteína
está sendo produzida e "exportada" para fora das células -o que
é interessante, segundo Vieira,
pois as bactérias costumam se
acumular justamente entre uma
célula e outra.
Um problema, no entanto, é a
possibilidade de que o bactericida
afete também microrganismos
benéficos que vivem em associação com o maracujazeiro -mais
ou menos como um antibiótico
que causa problemas digestivos
por acabar com a flora intestinal
de uma pessoa. Por isso, o grupo
está testando também uma construção de DNA com um promotor que só ativaria a produção na
presença da X. campestris.
Outra opção estudada, segundo
Vieira, é condicionar a produção
da proteína aos danos causados às
folhas do maracujazeiro por pulgões, que são os transmissores da
bactéria. "Esse tipo de dano faz
com que a planta secrete fenóides,
substâncias que ativam a cicatrização daquele ferimento", explica
a pesquisadora. Os fenóides poderiam também acionar a produção da proteína bactericida e barrar a entrada da X. campestris.
Vírus
A estratégia da equipe contra o
vírus do endurecimento dos frutos, por sua vez, lembra uma vacina. O gene a ser inserido pertence
ao próprio vírus e contém as instruções para produzir o capsídeo,
a capa de proteínas que envolve o
material genético viral -no caso,
RNA, e não DNA.
Ao receber o gene, a planta produziria uma fita de RNA complementar à do vírus. Essa fita "espelhada" produzida nas células vegetais modificadas impediria o
funcionamento normal dos genes
do vírus e, assim, a produção de
mais cópias do invasor pela célula
infectada. Em outras palavras, se a
estratégia funcionar como planejado, o maracujá estaria vacinado
contra o vírus.
De acordo com Vieira, as estratégias deverão passar por testes
em casas de vegetação por volta
de fevereiro do ano que vem,
quando será possível avaliar sua
eficácia para evitar ou diminuir a
infecção das plantas.
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