São Paulo, quinta-feira, 18 de julho de 2002

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BIOLOGIA

Dois estudos mostram que causador da doença é tão velho quanto a humanidade e pode sobreviver a tratamentos

Vacina contra malária fica mais distante

RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

O parasita causador da malária é bem mais antigo e seu material genético é bem mais diverso do que se imaginava, afirmam dois novos estudos publicados na edição de hoje da revista científica "Nature" (www.nature.com). Isso significa que desenvolver uma vacina contra ele, ou drogas mais eficazes, não será tão fácil quando parecia até agora.
A malária é causada por protozoário (ser de uma célula só, que não é nem animal, nem vegetal) do gênero Plasmodium.
Um dos estudos concluiu que o parasita da espécie mais perigosa, Plasmodium falciparum, originou-se entre 100 mil e 180 mil anos atrás. O outro estudo demonstrou que um gene ligado à resistência do parasita ao medicamento cloroquina é muito comum em plasmódios de várias partes do planeta.
A data sugerida para a origem do P. falciparum coincide com o momento em que se acredita que os seres humanos tenham começado a se espalhar pelo globo a partir de sua origem na África.
Estudos recentes indicavam que o parasita só teria se espalhado entre a população humana depois do aparecimento e da disseminação da agricultura, um evento bem mais recente, ocorrido entre 3.000 e 5.000 anos atrás.

Frutos genômicos
Os novos estudos foram feitos por duas equipes de cientistas, ambas coordenadas por Xin-Zhuan Su, do Instituto Nacional de Alergia e Doenças Infecciosas, de Bethesda, Maryland, EUA.
Graças ao projeto internacional de sequenciamento do genoma do parasita, uma das equipes coordenadas por Su pôde fazer uma análise mais aprofundada. Dois dos 14 cromossomos -estruturas que contêm o material genético- do P. falciparum já foram totalmente sequenciados (um em 1998, outro em 1999). Estima-se que o parasita tenha entre 6.000 e 7.000 genes.
Os pesquisadores estudaram partes da sequência de 204 genes do cromossomo três e toparam com uma variedade inesperada, que teria exigido dezenas de milhares de anos para surgir.
A descoberta de que o gene da resistência à cloroquina é tão comum e que se propagou com enorme rapidez dá outro banho de água fria nos pesquisadores, pois sugere que drogas com efeitos semelhantes também podem perder efeito rapidamente.
Não existe vacina eficaz contra malária, e os novos estudos mostram que uma vacina que controlasse apenas parte dos parasitas existentes -por exemplo, aqueles típicos de uma região do planeta- seria contraproducente.
"Se uma vacina controla apenas parte da população de P. falciparum, então ela poderia alterar a composição genética dos parasitas sobreviventes. A perspectiva assustadora é que essa vacina imperfeita poderia selecionar variantes do P. falciparum que seriam mais virulentas, potencialmente desfazendo qualquer progresso na direção de mitigar esse flagelo", afirmou o pesquisador Andrew Clark, da Universidade Cornell, de Ithaca, Nova York, em comentário aos dois trabalhos.
Dada sua história recente de desenvolvimento de resistência a drogas, o parasita da malária é um alvo difícil de combater. O mosquito transmissor do parasita também desenvolveu resistência a inseticidas. Por isso, diz Clark, um conhecimento detalhado da diversidade genética do plasmódio é fundamental para evitar desastres futuros.



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