São Paulo, sexta-feira, 19 de julho de 2002

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PALEONTOLOGIA

Crânio do animal, de 110 milhões de anos, tem crista que deveria servir para regular temperatura do corpo

Pesquisadores descrevem novo réptil alado do Ceará

Zulmair Rocha/Folha Imagem
O paleontólogo Alexander Kellner mostra réplica do fóssil e modelo de sua cabeça em entrevista coletiva no Museu Nacional


RICARDO BONALUME NETO
DA REPORTAGEM LOCAL

RAFAEL CARIELLO
DA SUCURSAL DO RIO

Dois pesquisadores brasileiros descreveram uma nova espécie de pterossauro, um réptil voador que conviveu com dinossauros 110 milhões de anos atrás.
Os restos fósseis indicam que se tratava de um animal de grande porte: de 4,2 a 4,5 metros da ponta de uma asa até a outra e 1,8 metro de comprimento.
O pterossauro voava rasante sobre o mar e sobre a laguna de Araripe, atual Estado do Ceará, pescando peixes e crustáceos com seu bico altamente especializado.
A descoberta está descrita na edição de hoje da revista científica americana "Science"(www.scienc emag.org). Os autores do estudo, Alexander W. A. Kellner, do Museu Nacional da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), e Diógenes de Almeida Campos, do DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral), apresentaram uma réplica do esqueleto do animal e uma reconstituição de sua cabeça ontem, numa entrevista coletiva na sede do museu.
O animal foi batizado com o nome científico Thalassodromeus sethi (em grego latinizado, corredor marinho de Seth, deus egípcio do caos e das tempestades).
Segundo Kellner, o T. sethi reforça a hipótese de que grandes répteis do Período Cretáceo (o último da era dos dinossauros, de 144 milhões a 65 milhões de anos atrás) teriam sangue quente.

Radiador
O crânio do animal tem um formato exótico, com uma grande crista cheia de ranhuras que seguem um padrão, interpretado pelo paleontólogo como uma evidência de que ela seria irrigada por vasos sanguíneos e serviria para a regulação térmica do réptil.
Há também quem ache que a crista poderia ser um adereço sexual dos machos, para atrair as fêmeas, ou uma marca distintiva de reconhecimento da espécie. "Toda a evidência sugere que, no T. sethi, a crista tinha múltiplas funções", escreveram os autores.
Os paleontólogos só não sabem dizer como uma crista tão grande (o crânio mede 1,4 metro) poderia afetar o vôo do pterossauro.
Os fragmentos do fóssil -pedaços da cabeça do animal, incluindo a crista- foram encontrados em 1983 por um morador da chapada do Araripe e doados a pesquisadores do DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral), órgão que regula e fiscaliza a mineração no país e que mantém milhares de fósseis -vários ainda não descritos- em sua coleção, no Rio.
Kellner só começou a estudar o fóssil há um ano e meio, devido à falta de recursos. Há seis meses, descobriu as ranhuras que indicavam vasos sanguíneos na crista e determinou que se tratava de uma nova espécie.
Os pesquisadores compararam o crânio e a mandíbula do Thalassodromeus com as de um pássaro moderno, a ave marinha Rynchops nigra, conhecida como talha-mar. Essa ave pescadora não mergulha, mas desliza sobre a superfície do mar, abre a mandíbula inferior e pesca peixes logo abaixo da superfície, como que "cortando" a água.
Os pterossauros foram os primeiros animais vertebrados a voar, antes das aves e dos morcegos. Surgiram no Período Triássico, há 215 milhões de anos, e viveram durante 150 milhões de anos até se extinguirem, no final do Cretáceo, 65 milhões de anos atrás, junto com os dinossauros.
Há mais de 120 espécies classificadas, que variam desde uma do tamanho de um passarinho até gigantes com envergadura de mais de dez metros.
A reconstituição do T. sethi será exposta a partir de amanhã no Museu Nacional, na Quinta da Boa Vista (São Cristóvão, zona norte do Rio). O fóssil, porém, ficará no Museu de Ciências da Terra, ligado ao DNPM.
Kellner afirma que precisa fazer novas pesquisas no material por ter descoberto, na semana passada, um orifício na sua crista.



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