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ASTRONOMIA
Aparelho de observação poderá ser capaz de estudar episódios cósmicos violentos, como colisões de galáxias
Telescópio no pólo Sul enxerga neutrinos
SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL
Steve Barwick, da Universidade
da Califórnia em Irvine, EUA,
vende seu instrumento como a
coisa mais revolucionária em observação astronômica desde a luneta de Galileu. Sua equipe, composta por pesquisadores de vários
países, começou a apresentar os
resultados do primeiro telescópio
de neutrinos do mundo, instalado
na Antártida. E a boa notícia é que
o negócio funciona.
"Desde que Galileu construiu
seu primeiro telescópio, há 400
anos, todos os sistemas envolvem
a observação de alguma frequência do espectro eletromagnético
-luz, rádio, infravermelho e assim por diante", diz. "Nesse sentido, o nosso aparelho é o primeiro
de um novo tipo, que observa
neutrinos. E mostramos que funciona, como anunciávamos."
Neutrinos são partículas extremamente sutis. Eles têm carga elétrica neutra, como os nêutrons,
mas são tão pequenos quanto um
elétron, o que torna sua detecção
particularmente complicada. Em
compensação, por conta da baixa
interatividade com outras partículas, os neutrinos emitidos por
determinados fenômenos têm
boa chance de chegar incólumes à
Terra e fornecer informações preciosas sobre esses episódios.
"Esses eventos violentos, explosivos e energéticos, como a colisão de galáxias, o surgimento de
buracos negros, a formação de
disparos de raios gama, todas essas coisas emitem uma porção de
neutrinos", diz Barwick. "Apesar
disso, os eventos normalmente
estão cobertos por poeira e sujeira
-a proverbial fuligem da chaminé-, de modo que não conseguimos ver a luz vinda deles. Já os
neutrinos conseguem escapar."
Encravado no gelo do pólo Sul,
o telescópio (chamado Amanda,
Conjunto Detector Antártico de
Neutrinos e Múons, na sigla em
inglês) tem por objetivo examinar
o céu do hemisfério Norte, captando as únicas partículas que
conseguem atravessar o planeta
inteiro e emergir do outro lado
-os neutrinos. Todas as outras
partículas, como fótons, prótons e
nêutrons, acabam retidas.
O sistema é composto por 677
módulos ópticos, cada um do tamanho de uma bola de boliche, fixados em 19 cabos enterrados no
gelo antártico. A detecção dos
neutrinos é feita a partir da interação do gelo com um múon (tipo
de elétron 207 vezes mais pesado
que o normal), gerado justamente
pela chegada de um neutrino, vindo da mesma direção.
Analisando a direção do múon
detectado, eles podem calcular de
onde veio o neutrino e realizar um
mapeamento das fontes observadas no céu. O aparelho já está coletando informações desde 1997, e
recentemente os cientistas produziram o primeiro mapeamento do
céu do hemisfério Norte, com base em dados coletados em 2000.
Apesar disso, Barwich diz que
nenhum dos neutrinos rastreados
vem do espaço cósmico: todos
eles vieram do Sol ou da própria
atmosfera da Terra. Embora decepcione alguns astrônomos, a
não-detecção é uma descoberta
em si. "Serve para dizer a alguns
cientistas que seus modelos para a
emissão de neutrinos por certos
objetos estão errados -lamento,
mas os neutrinos não estão lá."
Num ponto futuro, no entanto,
os neutrinos vindos de longe também estarão ao alcance da tecnologia. Barwick conta que já recebeu a aprovação da Fundação Nacional de Ciência dos EUA para
montar um telescópio dez vezes
mais potente na Antártida, o Icecube, que pode já ser capaz de fazer astronomia de neutrinos. "Estamos com os dedos cruzados."
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