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MICRO/MACRO
A seleção natural e a influência em nosso comportamento
MARCELO GLEISER
especial para a Folha
Um dos grandes desafios da
psicologia moderna é uma explicação generalizada de certas características do comportamento
humano. Por exemplo, preferências sexuais. Em um estudo
realizado nos EUA com estudantes universitários, 50% dos homens e 50% das mulheres aceitariam um convite para sair com
uma pessoa desconhecida do sexo oposto. Mas, enquanto nenhuma das mulheres aceitaria
imediatamente ir para a cama
com o desconhecido, 75% dos
homens iriam de olhos fechados.
Por que essa diferença tão óbvia
de comportamento?
Durante a última década, evolucionistas, anteriormente mais
preocupados com os aspectos
biológicos do processo de seleção natural, resolveram aplicar
algumas de suas técnicas para
tentar compreender certas tendências sociais.
No século 19, o inglês Charles
Darwin propôs que as variações
entre as espécies no mundo animal e vegetal são consequência
de um processo contínuo de
adaptação, baseado em mutações genéticas controladas pela
seleção natural. Um animal de
pescoço curto, cuja dieta é baseada em folhas, não sobreviverá
em uma floresta de árvores altas.
Mas, se por acaso esse animal tiver um descendente de pescoço
longo, esse descendente terá todas as folhas à sua disposição.
A idéia básica da teoria de Darwin é que essa mutação de um
animal de pescoço curto em um
de pescoço longo se dá lenta e
aleatoriamente em nível genético. A seleção natural apenas dita
quais as mutações que ajudam
(ou não) na sobrevivência de
uma dada espécie. Aquelas que
ajudam a prole a sobreviver em
um ambiente austero são "selecionadas" e passam a ser parte
de seu código genético, sendo
transmitidas às futuras gerações.
Segundo a teoria da evolução,
a função do sexo é a transmissão
de genes, que é fundamental para a sobrevivência da espécie.
Sem uma prole, a espécie não sobrevive. E aqui, as diferenças físicas entre homens e mulheres
são fundamentais: enquanto um
homem com 50 esposas pode gerar uma prole enorme, uma mulher com 50 maridos estará sempre limitada pelo período de gestação. Portanto, se, para um homem, sob o ponto de vista de
propagação de seus genes para
proles futuras, "quanto mais,
melhor", para uma mulher, a
seleção de um parceiro deve ser
feita com muita cautela. Ele deve
ser dono de genes de "boa qualidade", ou seja, genes que irão
garantir a sobrevivência de sua
prole.
Há 200 mil anos isso significava o mais forte guerreiro, o melhor caçador, o mais poderoso
líder. Claro, as condições sociais
que definem a escolha de um
parceiro mudaram completamente, mas não as limitações físicas. Segundo os evolucionistas
sociais, os genes que determinaram a sobrevivência de nossa espécie ainda ditam nosso comportamento e nossas escolhas
sexuais, mesmo que sua atuação
seja um pouco mais discreta, devido a um sofisticado código
moral, baseado na religião.
Aparentemente, a atuação desse processo de seleção de parceiros atua até mesmo de forma inconsciente. Homens e mulheres
preferem parceiros "simétricos". Um corpo bem-proporcionado é sinal de que os genes
que atuaram em sua construção
são robustos contra agentes patogênicos. Por exemplo, vários
testes determinaram que homens preferem mulheres com
quadris aproximadamente 70%
maiores do que a cintura. Modelos famosos, como a magérrima
Twiggy, ou as figuras gordotas
do pintor Rubens, satisfazem a
essa regra. As estatuetas da "Vênus do Paleolítico", de 28 mil
anos, também. Por que isso?
Quadris e cintura são proporcionados por hormônios sexuais,
em particular o estrogênio. E a
quantidade ideal de estrogênio
para fertilidade máxima é também a que determina a razão de
70% entre cintura e quadril. Alguns críticos acham essas idéias
uma simplificação do comportamento humano. Mas será que
nós podemos ignorar nosso lado
"animal"?
Marcelo Gleiser é professor de física teórica
do Dartmouth College, em Hanover (EUA), e
autor do livro "A Dança do Universo"
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