São Paulo, segunda-feira, 19 de agosto de 2002

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MEDICINA

Técnica desenvolvida por israelenses pode ser útil para câncer cerebral

RNA leva tumor a cometer suicídio

REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA

Se o organismo não se dá conta de que está abrigando um tumor, a estratégia pode ser um tanto maquiavélica, mas simples: induzi-lo a achar que as células cancerosas estão ocupadas por um vírus e forçá-lo a reagir.
Essa idéia, testada pelos cientistas Alexander Levitzki e Alexei Shir, da Universidade Hebraica de Jerusalém, conseguiu eliminar ou reduzir em 70% uma forma de glioblastoma, tumor cerebral que resiste a todas as formas conhecidas de terapia e, em geral, mata seu portador em um ano.
De quebra, a técnica usa como arma trechos de RNA (a molécula que precede a produção de proteínas) que só afetariam células geneticamente defeituosas, o que evitaria efeitos colaterais.
A tática ainda precisa ser testada em humanos e tem de resolver uma série de problemas, mas os pesquisadores dizem que ela pode se tornar uma opção viável, ao menos para tumores cerebrais.
O estudo, publicado hoje na edição on-line da revista científica "Nature Biotechnology" (www.nature.com/nbt), lança mão de um mecanismo usado normalmente pelo organismo, explica Levitzki: "Nós criamos um RNA de fita dupla, que em geral é o produto de uma infecção viral", disse o bioquímico à Folha.
É que o RNA, ao contrário do DNA, costuma aparecer numa cadeia simples, e não dupla. Se o contrário ocorre, acontece a ativação de uma enzima chamada PKR, que ataca o erro forçando a célula a cometer suicídio.
"Nesse caso, a nossa idéia era construir um RNA de fita dupla que estivesse presente apenas na célula cancerosa", afirma Levitzki. Para isso, a dupla se aproveitou do próprio problema genético que causou o câncer: uma deleção (apagamento) de bases ou "letras" químicas que colocou lado a lado áreas do DNA que normalmente estariam separadas.
O RNA é de modo geral produzido com base nas sequências de DNA. Por isso, tudo o que os pesquisadores israelenses tiveram de fazer foi criar essa sequência e inseri-la no tumor, esperando que ela se unisse à versão complementar que já estava lá dentro.
No tubo de ensaio e em camundongos, o truque funcionou: o RNA levou 70% do tumor a morrer. O problema agora, diz a dupla, é levar o RNA a tumores maiores, porque ele tende a ficar restrito às células externas. "Talvez uma injeção local constante resolva isso", diz Levitzki.


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