São Paulo, quarta-feira, 21 de janeiro de 2004

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ESPAÇO

Meta da comissão é entregar relatório ao ministro da Defesa na sexta; documento não dará causa exata do acidente

Investigação do VLS acaba nesta semana

Flávio Florido - 25.ago.2003/Folha Imagem
Destroços da plataforma onde se incendiou o VLS-1, no Centro de Lançamento de Alcântara (MA)


SALVADOR NOGUEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

A comissão instituída pela Aeronáutica para investigar o acidente com o VLS-1 (Veículo Lançador de Satélites) deve antecipar a apresentação de seu relatório para o final desta semana. O prazo em vigor exigia a conclusão dos trabalhos para 15 de fevereiro.
A intenção do grupo liderado pelo brigadeiro-do-ar Marco Antonio Couto do Nascimento é apresentar o relatório ao ministro da Defesa, José Viegas, ainda nesta sexta-feira. Mas a ação dependerá da agenda do ministro, que viajaria a São José dos Campos (SP), para receber o documento.
A conclusão das investigações vem após cinco meses de trabalho ininterrupto. Foram também cinco os adiamentos na conclusão dos trabalhos. O relatório final vai apresentar algumas hipóteses, mas não indicará a causa física exata do acidente.
"Isso é uma coisa que a gente não vai descobrir, com certeza, jamais", disse à Folha Paulo Murilo Castro de Oliveira, da Universidade Federal Fluminense, um dos membros indicados pela comunidade científica para integrar a comissão, a pedido do ministro Viegas, no início das investigações.
Procurado pela Folha para comentar as declarações, Carlos Henrique de Brito Cruz, reitor da Unicamp e também membro da comissão, disse, por meio de sua assessoria de imprensa, que não se manifestaria sobre o assunto.
O acidente ocorreu em 22 de agosto de 2003, quando um incêndio na plataforma do VLS-1, no Centro de Lançamento de Alcântara (MA), matou 21 técnicos e engenheiros do IAE (Instituto de Aeronáutica e Espaço) do CTA (Centro Técnico Aeroespacial), integrantes das equipes responsáveis pela preparação do lançador de satélites brasileiro.
O incêndio começou com o disparo prematuro de um dos quatro motores do primeiro estágio do lançador. A queima levou à combustão dos outros estágios do veículo, causando um acidente sem precedentes na história do programa espacial brasileiro.
Após cerca de 150 dias de investigação, a comissão chefiada por Couto conseguiu chegar à provável origem do disparo acidental -o próprio mecanismo de ignição do motor. "Temos evidências fortíssimas de que ele entrou em ignição pelo sistema normal de ignição. Então, de um foguete de 10 mil componentes e 30 metros, fechamos numa pecinha de um centímetro", afirma Oliveira.
Por outro lado, ninguém sabe apontar o que levou esse ignitor a se acionar. A hipótese mais provável é a de uma corrente elétrica, que ninguém sabe dizer como pode ter ido parar lá. A respeito disso, há apenas especulações.
Apesar de não ter encontrado a causa física exata para o acidente, o relatório apontará diversas irregularidades durante os procedimentos de preparação do foguete que antecederam a tragédia. Não fosse a catástrofe, teria sido a terceira tentativa de lançar o VLS-1. As duas primeiras, em 1997 e 1999, também fracassaram.
Não serão apontados possíveis culpados pelo acidente. "Essa não é a função desta comissão, fazer investigação policial", diz Oliveira. "Não é nossa função imputar culpa a ninguém."
Por outro lado, Oliveira espera grandes mudanças no programa espacial brasileiro após a apresentação do relatório, que está dividido em quatro componentes: operações, fator humano, meteorologia e materiais. Para cada um foi estabelecida uma subcomissão. "Na verdade, são quatro relatórios, mais uma sinopse que reúne todos eles", afirma o físico.
Para ele, o mais importante é o relatório de operações, que não só detalha as irregularidades cometidas durante a operação de lançamento, mas também apresenta sugestões e recomendações para evitar reincidências.
Pela primeira vez, ele diz, uma análise profunda do dia-a-dia da execução do projeto foi conduzida. "Infelizmente, teve de haver essa catástrofe para que isso acontecesse. Mas antes tarde do que nunca."
Pode ser o começo do renascimento do programa espacial. "É óbvio que ele precisa ser reestruturado", diz. "Acho que o nosso relatório vai ser usado para isso."
Da suposta falta de transparência da comissão, que não deu satisfações periódicas do avanço dos trabalhos como havia prometido originalmente, Oliveira diz que os membros acabaram sobrecarregados e, por isso, não puderam fazer isso a contento. "Foi uma coisa tão estafante que isso acabou ficando para as calendas."


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