São Paulo, quinta-feira, 22 de julho de 2004

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FÍSICA

Autor de "Uma Breve História do Tempo" afirma que matéria que cai nesses objetos celestes não some para sempre

Hawking diz que errou sobre buraco negro

John Cogill/Associated Press
Stephen Hawking apresenta nova teoria em seminário, ontem


DA REDAÇÃO

O físico britânico Stephen W. Hawking, um dos cientistas mais famosos (e menos entendidos) do mundo, negou as próprias teorias ontem e afirmou que os buracos negros não destroem tudo o que engolem, mas acabam regurgitando matéria e energia "numa forma distorcida".
A idéia, apresentada para uma platéia de 600 astrofísicos e matemáticos na 17ª Conferência sobre Relatividade Geral e Gravitação em Dublin, Irlanda, põe fim a um debate de quase três décadas sobre o destino dos buracos negros.
Além de lançar por terra a hipótese que o tornou famoso no mundo da física em 1975, o novo trabalho representa uma prosaica derrota pessoal para Hawking: ele teve de dar de presente ao físico americano John Preskill uma enciclopédia de beisebol, resultado de uma aposta feita na época.
O cientista inglês, hoje professor lucasiano de matemática da Universidade de Cambridge (a mesma cadeira ocupada por Isaac Newton), havia calculado nos anos 70 que os buracos negros -estrelas que viram aspiradores de pó cósmicos quando morrem, tragando tudo o que existe na sua vizinhança, inclusive a luz- perdem massa por meio da emissão de um tipo de energia conhecido hoje como "radiação Hawking".
O físico propôs na época que tudo o que ultrapassava a borda de um buraco negro e caía nele se desconectava do Universo. Depois que o buraco negro evaporava, a informação contida na matéria tragada se perdia para sempre.
A proposta era um paradoxo, pois a teoria que rege as partículas subatômicas diz que esses elementos não podem ser destruídos. Hawking, 62, havia inclusive afirmado que a matéria viajava através do buraco negro para uma espécie de universo paralelo.
"Não há nenhum universo-bebê brotando, como eu pensava. A informação permanece firmemente no nosso Universo", afirmou em sua conferência.
"Sinto muito desapontar os fãs de ficção científica, mas, se a informação é preservada, não existe a possibilidade de usar buracos negros para viajar a outros universos", continuou. "Se você pular dentro de um buraco negro, sua energia de massa será devolvida ao nosso Universo, mas numa forma distorcida, que contém informação sobre o que você era, mas num estado irreconhecível."
Pouca gente entendeu a palestra. "A platéia saiu com várias questões. A complexidade das teorias físicas modernas não permite que um seminário baste para esclarecer todos os detalhes", disse à Folha George Matsas, do Instituto de Física Teórica da Unesp, que assistiu à apresentação.
Segundo Matsas, a solução proposta por Hawking ao próprio paradoxo se apóia num pedaço da teoria da gravitação quântica chamado gravitação quântica euclidiana. Detalhe: a gravitação (que explica o comportamento de corpos muito grandes) e a teoria quântica (que explica o comportamento das partículas subatômicas) são idéias que não casam. Até hoje não se provou, por exemplo, a existência da partícula responsável pela força gravitacional.
"Creio ser cedo para ter certeza de algo ainda", diz Matsas. "Ceticismo é um ingrediente que diferencia ciência de astrologia. A audiência dará seu veredicto ao longo do tempo, com análises detalhadas. Quem viver verá".
Em uma tirada de humor, Hawking presenteou o americano John Preskill -que em 1975 insistiu que a matéria não podia ser destruída pelo buraco negro- com uma enciclopédia de beisebol trazida dos EUA.
"Tive grande dificuldade para achar uma aqui, então tentei oferecer uma de críquete, mas John não aceita a superioridade do críquete", disse o físico, portador de uma doença degenerativa (esclerose lateral amiotrófica), que vive numa cadeira de rodas e se comunica por um sintetizador de voz.
Preskill se declarou feliz afinal por ter ganho a aposta, mas confessou: "Para ser honesto, não entendi a palestra."

Com agências internacionais


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