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PALEONTOLOGIA
Animal emplumado cujo fóssil foi descoberto na China planava entre as árvores há 130 milhões de anos
Dino de quatro "asas" explica vôo nas aves
CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA
Um dinossauro esquisito de 130
milhões de anos e quatro "asas"
pode ser a resposta para a questão
da origem do vôo nas aves. A
aposta é de cientistas chineses,
que apresentam o achado hoje.
O animal, cujos fósseis foram
encontrados num estado excepcional de preservação, não impressiona pelo tamanho: com
apenas 77 centímetros de comprimento, recebeu o apropriado nome de Microraptor gui.
A grandeza do fóssil está no fato
de ele ter penas adaptadas para o
vôo tanto nas patas da frente
quanto nas de trás, uma característica inédita, que sugere ter sido
ele o primeiro dino capaz de voar
-planando entre árvores.
"Tenho descrito muitas espécies de dinossauro com penas,
mas fiquei realmente animado
com esse. Era um animal completamente inesperado", disse à Folha, por telefone, o paleontólogo
Xing Xu, da Academia Chinesa de
Ciências. Ele e quatro colegas
apresentaram o novo dinossauro
hoje, na revista científica "Nature" (www.nature.com). No trabalho, comunicam ainda a descoberta de cinco outros fósseis. "Todos têm quatro asas", disse Xu.
Idéia antiga
O fóssil do M. gui foi comprado
pelo grupo de Xu em 2001, durante uma expedição à província de
Liaoning. A região teve diversos
vulcões no passado, o que facilitou a preservação dos fósseis -os
animais eram aprisionados nas
cinzas. Ali têm sido descobertos
vários restos de dinossauros emplumados, o que ajudou a confirmar a tese de que as aves modernas evoluíram a partir de um grupo de dinossauros bípedes, o dos
dromeossaurídeos.
O que ninguém sabia, no entanto, era como o grupo começou a
voar. O fóssil da ave mais primitiva do mundo, o Archaeopteryx,
sugeria que o vôo tivesse se originado "de baixo para cima", ou seja, de animais corredores cujas
patas dianteiras viraram asas.
Uma hipótese concorrente foi
proposta em 1915 pelo ornitólogo
e explorador americano William
Beebe, mais famoso por ter sido o
primeiro homem a mergulhar no
oceano a bordo de uma esfera oca
de metal (em 1930).
Beebe propôs que os ancestrais
das aves tivessem sido seres de
quatro "asas", que, em vez de ter
vôo autônomo, planavam entre as
árvores como fazem hoje algumas
espécies de esquilo. Para ele, o vôo
teria surgido "de cima para baixo". Foi preciso esperar 88 anos
para que se encontrasse uma evidência a favor da hipótese.
"Nem os dromeossauros basais
[mais primitivos, portanto, mais
próximos das aves], nem o próprio Archaeopteryx tinham penas
nas pernas, o que favorecia a hipótese do vôo de baixo para cima", afirmou o paleontólogo Max
Langer, da USP de Ribeirão Preto.
Segundo Xu, o esqueleto do Microraptor gui não deixa dúvidas: o
animal tinha penas longas e de tamanhos diferentes tanto nas patas
traseiras quanto nas dianteiras. Essa
assimetria, presente nas asas das
aves modernas -mas não nas
patas de outros dinos- é um indicativo de que as penas fossem
realmente usadas pelo animal para algo parecido com vôo.
"A primeira coisa que pensei ao
vê-las foi: "É de verdade?" Achei
que se tratasse de um problema
de preparação do fóssil", disse o
pesquisador chinês.
Para ele, o achado indica que o
ancestral comum das aves e dos
dromeossauros era um animal
pequeno, de quatro patas, que
morava em árvores e planava
usando quatro falsas asas. Durante a evolução, os pássaros perderam as penas nas pernas e desenvolveram asas verdadeiras.
Caso único?
Apesar de se dizer empolgado
com a descoberta, Langer não vai
tão longe. Para o brasileiro, o fato
de uma espécie ter essa adaptação
para planar não significa que todas as aves tenham evoluído a
partir de um dinossauro de quatro "asas". "Ele parece uma linhagem à parte. Não indica que os ancestrais diretos das aves tenham
tido penas nas pernas", afirmou.
Ainda segundo Langer, no entanto, o fóssil do Microraptor gui
é emblemático pelo seu comportamento: trata-se de um dromeossaurídeo primitivo que morava em árvores -um habitat insuspeito para dinossauros, que
eram animais terrestres.
"Todos os dromeossauros basais que se conhece eram corredores. Encontrar um bicho claramente arborícola traz a necessidade de uma reinterpretação."
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