|
Texto Anterior | Índice
Vírus é pouco variável, afirmam cientistas
CLAUDIO ANGELO
EDITOR-ASSISTENTE DE CIÊNCIA
O vírus causador da pneumonia
asiática deve entrar, ao lado do
HIV, do Ebola e da febre amarela,
para a enorme galeria dos patógenos assassinos que saíram da natureza e atingiram seres humanos. Estudos genéticos mostram,
no entanto, que ele não pertence a
uma outra classe -a dos assassinos mutantes. E isso pode ser
uma boa notícia.
Segundo pesquisadores que estudam a evolução do parasita, cujo nome oficial é "coronavírus Urbani Sars-associado", a mais nova
dor de cabeça da humanidade parasitava algum animal -possivelmente uma ave- na China e,
por alguma razão, "pulou" a barreira de espécies. "Esse vírus é antigo e é uma zoonose", diz o virologista Paolo Zanotto, da USP,
que está preparando um diagnóstico molecular da pneumonia.
Essa antiguidade pode significar
que o causador da doença, também conhecida como Sars (sigla
em inglês para síndrome respiratória aguda grave), não sofre mutações com tanta facilidade. Isso é
tudo o que esperam órgãos como
os Institutos Nacionais de Saúde
(NIH) dos EUA, que correm atrás
de uma vacina para a doença.
Quanto mais facilmente um vírus
sofre mutações, ou seja, trocas ou
perdas de "letras" químicas nos
seus genes, mais difícil é a obtenção de vacinas eficientes.
O caso clássico de vírus tornado
assassino por uma mutação é o da
gripe de 1918, a chamada gripe espanhola. Ela matou cerca de 20
milhões de pessoas. Assim como
o agente causador da Sars, o vírus
da gripe espanhola surgiu na China, país com uma grande população rural, onde porcos e aves costumam ser criados juntos e perto
demais de humanos.
O que o tornou um matador tão
eficiente foi uma recombinação:
genes de uma linhagem de vírus
da gripe de patos e de uma linhagem de vírus de porcos se misturaram, dando origem a um patógeno contra o qual seres humanos
simplesmente não tinham defesa.
Assim como o influenza, vírus
causador da gripe, os coronavírus
(que, em humanos, costumam
causar apenas resfriados) são sujeitos a recombinação. Mas esse
não parece ser o caso do coronavírus da Sars.
"As análises feitas com diferentes genes sequenciados até o momento indicam que esse não parece ser um recombinante", disse
à Folha a médica Teresa Peret,
dos CDC (Centros para Controle
e Prevenção de Doenças) dos
EUA, uma brasileira que integrou
a equipe que identificou o vírus.
Cientistas chineses estão tentando, agora, descobrir de que
animal o novo coronavírus saltou
para os humanos. Identificar essa
espécie -o reservatório, na linguagem técnica- é importante
para quebrar a cadeia de transmissão da epidemia. Segundo Zanotto, o animal que se procura é
muito provavelmente uma ave.
Para o cientista, o coronavírus
Urbani pode ter um calcanhar-de-aquiles: o tamanho de seu genoma. Com 29 mil pares de "letras", é um dos maiores genomas
de vírus de RNA conhecidos.
"Para ter um genoma desse tamanho, ele precisa de grande fidelidade de replicação", afirma Zanotto. Ou seja: algum mecanismo
genético que faça a partícula produzir cópias de si mesma sem
muitas trocas de "letras" no RNA.
Isso pode ser uma boa coisa,
avalia, já que a tendência do vírus
seria a de mudar pouco, facilitando a produção de uma vacina.
"Existem no mercado vacinas para coronavírus de aves e cachorros. E elas funcionam bem", afirmou o pesquisador da USP.
Texto Anterior: Pneumonia asiática: China conterá mal se agir rápido, diz OMS Índice
|