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SAÚDE
Pesquisa mostra como plasmódio, micróbio causador da moléstia, retira cálcio do sangue do doente para sobreviver
Estudo da USP revela "truque" da malária
REINALDO JOSÉ LOPES
FREE-LANCE PARA A FOLHA
Com ajuda de uma série de truques, o plasmódio -parasita
causador da malária- consegue
prosperar com folga no organismo humano. Uma dessas artimanhas acaba de ser desmascarada
por pesquisadores da USP: eles
descobriram como a criatura sobrevive à falta de cálcio, essencial
para sua existência, dentro dos
glóbulos vermelhos do sangue.
A descoberta pode oferecer aos
cientistas um novo alvo para contra-atacar o Plasmodium falciparum e seus parentes, cuja ação
mata cerca de 1 milhão de pessoas
por ano no mundo, sobretudo na
África (no Brasil houve 388 mil
casos e 98 mortes em 2001).
"Entender como ele faz isso é
um enorme salto", diz Célia Regina da Silva Garcia, 44, do IB (Instituto de Biociências) da USP. Em
colaboração com Marcos Gazarini, Garcia coordenou o estudo
publicado neste mês da revista
científica "Journal of Cell Biology" (www.jcb.org). O trabalho
foi tema do editorial da revista.
Garcia explica que a concentração de cálcio dentro das células vivas é sempre baixa. Ao mesmo
tempo, o ideal para todas elas é
que fiquem circundadas por um
ambiente rico nesse elemento
químico, com uma concentração
cerca de 10 mil vezes maior. Uma
série de reações químicas fundamentais para o metabolismo e para a multiplicação das células precisa de certas quantidades de cálcio para funcionar.
No caso do plasmódio, o próprio grupo da pesquisadora havia
descoberto, em 2000, que o parasita usava o elemento para sinalizar os diferentes momentos de
seu complicado ciclo de vida, que
tem uma fase crucial no sangue
(veja quadro à direita).
Para conseguir fazer isso, mesmo estando confinado nos glóbulos vermelhos com baixa concentração de cálcio, o micróbio usa o
vacúolo parasitóforo (VP) -uma
espécie de bolsa que envolve o
plasmódio enquanto ele ocupa o
interior dessas células sanguíneas.
"A nossa hipótese era que o VP
funcionava como um microambiente no qual o plasmódio conseguia manter um nível elevado
de cálcio", conta Garcia.
Para descobrir se havia mesmo
uma diferença entre as concentrações do elemento dentro do vacúolo e no parasita, os pesquisadores usaram corantes que mudavam de cor na presença de cálcio. Por causa de sua composição
química, um deles ficava restrito
ao vacúolo, enquanto o outro entrava no plasmódio.
Como era de esperar, o corante
que foi para o vacúolo gerou um
brilho muito maior, denunciando
altos níveis de cálcio. Faltava determinar, contudo, qual o mecanismo usado para obter as doses
maciças do elemento escasso.
Já se sabia havia algum tempo
que, para criar o VP, o parasita
captura componentes da membrana da célula invadida, misturando-os aos que ele próprio
constrói. "Os glóbulos vermelhos
têm, na sua membrana, uma
bomba de cálcio que expulsa o excesso do elemento para fora da célula", diz. "Quando o plasmódio a
invade, ele vira essa bomba na direção contrária, e ela passa a mandar o cálcio para o vacúolo."
"Agora, com o genoma do plasmódio [cujo sequenciamento foi
concluído no ano passado", vai
ser possível saber como ele faz isso e bloquear o mecanismo", diz
Garcia. A pesquisa teve apoio da
Fapesp (Fundação de Amparo à
Pesquisa do Estado de São Paulo).
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